Partidos comunistas, revolucionários e progressistas da América Latina reúnem-se de sexta (26) a domingo em Lima, Peru, num encontro para analisar a atual conjuntura regional, as experiências de governo, de lutas políticas de massas e o embate contra a ofensiva neoliberal e conservadora.
O objetivo é dar passos, depois do exitoso 22º Encontro do Foro de São Paulo em El Salvador, em junho último, para elaborar um programa político comum.
Por José Reinaldo Carvalho (*)
Organizado pelos partidos Comunista Peruano e Comunista-Pátria Roja, em processo de unificação, o encontro fará uma discussão multilateral sobre as experiências dos governos de esquerda e progressistas na região. Para isso contará, para além dos partidos comunistas, com as presenças do Partido dos Trabalhadores (Brasil), Frente Sandinista de Libertação Nacional (Nicarágua), Frente Farabundo Martí de Libertação nacional (El Salvador), Partido Socialista Unido da Venezuela, Movimento Ao Socialismo (Bolívia), Aliança País (Equador), Frente Ampla (Uruguai), Partido da Revolução Democrática (México) e Partido do Trabalho (México).
No programa prevê-se também um debate sobre o papel dos partidos comunistas e revolucionários na luta pela independência, transformações políticas e sociais e a realização de profundas reformas estruturais democráticas.
Os dirigentes comunistas peruanos Roberto de la Cruz (PCP) e Alberto Moreno (PCP-Pátria Roja) sublinharam em declarações à imprensa a importância de reunir as forças comunistas, de esquerda e progressistas na luta por mudanças de fundo na região, diante do fracasso do neoliberalismo e dos regimes das classes dominantes.
Ambos os dirigentes destacaram a participação dos comunistas nessa luta, como forças avançadas ligadas aos trabalhadores.
A convocação da reunião assinala que o capitalismo executa uma estratégia mundial, perante a qual as revoluções, sendo nacionais na forma, têm tarefas comuns por seu conteúdo e projeção histórica, o que implica desenvolver uma estratégia comum.
“A América Latina vive momentos carregados de grandes expectativas mas também de graves ameaças. Depois da Revolução Cubana, a instauração de governos progressistas nos últimos 15 anos mostra um cenário novo que golpeou seriamente a hegemonia do imperialismo, algo que este não está disposto a suportar”, diz o documento.
A convocação acrescenta que a contraofensiva do imperialismo está permitindo que este consiga êxitos parciais, como a instauração de governos neoliberais na Argentina e no Brasil. No caso de nosso país, através de um golpe parlamentar, judicial e midiático.
A convocação acrescenta que a contraofensiva do imperialismo está permitindo que este consiga êxitos parciais, como a instauração de governos neoliberais na Argentina e no Brasil. No caso de nosso país, através de um golpe parlamentar, judicial e midiático.
O documento dos dois partidos comunistas peruanos adverte que o imperialismo pretende golpear a Venezuela e outros países que saíram da sua área de influência, o que se deve responder com criatividade e iniciativa, afirmando as bandeiras do socialismo.
O Partido Comunista do Brasil, o Partido Comunista Brasileiro e o Partido dos Trabalhadores compõem a diversificada delegação de nosso país.
O evento contará com as presenças do chefe do Departamento de Relações Internacionais do Partido Comunista de Cuba, José Ramón Balaguer, e do ex-ministro da Economia da Venezuela, Rodrigo Cabezas, responsável internacional do Partido Socialista Unido de Venezuela (PSUV). Os comunistas, revolucionários e progressistas latino-americanos terão como convidados os partidos comunistas da China e do Vietnã e o Partido do Trabalho da Coreia.
Vamos compartilhar nesse evento a análise do PCdoB sobre o quadro internacional e latino-americano e fazer a contundente denúncia do golpe de Estado no Brasil.
Devemos ser incansáveis no combate às políticas de domínio político, econômico e militar do imperialismo estadunidense e seus aliados. A ação belicista do imperialismo é uma constante no Oriente Médio, na Ásia, na África, na Europa e na América Latina. Estão em curso a aplicação da estratégia imperialista de construção do chamado “novo Oriente Médio”; a destruição da Líbia e sua transformação em diferentes tipos de protetorados a serviço de potências estrangeiras; a guerra devastadora na Síria, provocada pelo imperialismo em conluio com regimes reacionários na região do Oriente Médio e grupos terroristas; a expansão da Otan para o leste, numa estratégia de cerco e provocação à Rússia; a política de ocupação, colonização, limpeza étnica e terrorismo do Estado de Israel contra o povo palestino, com o apoio explícito do imperialismo estadunidense.
Os Estados Unidos desenvolvem uma forte contraofensiva na América Latina e no Caribe para depor os governos progressistas e de esquerda, como trampolim para controlar os mercados e saquear as matérias primas da região. A direita continental subordinada ao imperialismo norte-americano tem intensificado as ações visando a interromper e reverter os processos de mudança social que se desenvolvem há quase duas décadas. A região da América Latina e Caribe conquistou importantes avanços. Aprofundou-se e ampliou-se a democracia, teve início um novo ciclo de desenvolvimento econômico, progresso social, integração solidária e soberania nacional. Esse processo resulta numa efetiva contribuição à paz. É de grande significação que a Comunidade de Estados Latino-americanos e caribenhos tenha proclamado o Continente como uma “zona de paz”.
Nesse contexto, tem enorme importância a heroica vitória da Revolução Cubana em sua batalha de mais de meio século frente à agressividade do imperialismo norte-americano, com o reconhecimento dos Estados Unidos da derrota de sua política em relação a Cuba e com o início do processo de normalização de relações entre ambos os países, que no entanto não será possível se não se põe fim ao criminoso bloqueio econômico que foi declarado obsoleto pelo próprio governo estadunidense, e a ilegal ocupação do território cubano pela base naval em Guantánamo.
Uma vitória incontestável das forças democráticas na região foi o avanço nos diálogos de paz na Colômbia entre o governo e as Farc-EP, resultado da heroica luta do povo. Nesse processo tem sido fundamental o papel de apoio e solidariedade da comunidade internacional ao respaldar as negociações e sua decisão de se envolver no monitoramento e verificação dos acordos para a sua aplicação integral.
No cenário latino-americano adquire cada vez maior relevo a luta em defesa da República Bolivariana da Venezuela e de sua revolução, em face das constantes ameaças de desestabilização e intervenção provenientes da oligarquia local em conluio com os Estados Unidos.
Nos dias em que estamos reunidos em Lima, realizam-se os atos finais do golpe de Estado, de caráter antidemocrático, antipopular e antinacional no Brasil. Os golpistas brasileiros tentam convencer a opinião pública nacional e internacional que a destituição da presidenta Dilma Rousseff não é um golpe porque o impeachment é previsto na Constituição e todos os ritos formais foram cumpridos.
A Constituição da República estabeleceu o impeachment como mecanismo juridicamente válido para destituir o (a) presidente da República. O pressuposto para isto é que o mandatário incorra em crime de responsabilidade. Contudo, os autores do processo de impeachment não apresentaram indícios nem provas de que a presidenta Dilma Rousseff tenha incorrido em tal crime. Acusam-na de ter falhado na execução do Orçamento governamental porque tomou medidas administrativas e financeiras extraordinárias para assegurar, num momento de restrições monetárias decorrentes das dificuldades econômicas, a realização das políticas públicas e sociais e financiar o desenvolvimento econômico. As motivações do processo de impeachment são políticas, um pretexto para, sob uma argumentação jurídica, derrubar a presidenta da República. A destituição da mais alta mandatária do país sem que tenha cometido crime de responsabilidade é sim uma forma de golpe político, um golpe de Estado.
Obviamente, é um golpe distinto dos tradicionais golpes militares, pois é outra a conjuntura mundial, assim como é diferente o contexto político nacional. Agora, trata-se de um golpe institucional e midiático, em que setores do aparato policial e judicial agem em conluio com a oposição neoliberal e conservadora.
A oposição neoliberal e conservadora, não aceitou a derrota pela quarta vez consecutiva, nas últimas eleições presidenciais de outubro de 2014. Essa oposição imaginava que conseguiria naquelas eleições interromper o ciclo progressista inaugurado no país com a primeira eleição de Lula, em 2002, que, malgrado as lacunas, fez com que o país avançasse na realização de importantes mudanças políticas e sociais, no exercício da solidariedade internacional e na construção de uma América Latina independente. Vista de uma perspectiva mais larga, a crise política atual é também a expressão das contradições estruturais e dos conflitos de fundo da sociedade brasileira. É a expressão de uma luta entre dois caminhos, da encruzilhada histórica do país. O caminho que pode levar o Brasil a se afirmar como nação democrática, independente e socialmente justa, em antagonismo ao que conduz à manutenção dos privilégios das classes dominantes, da dependência aos potentados internacionais, ao subdesenvolvimento e vigência de um poder político antidemocrático.
O golpe de Estado em curso no Brasil é parte da estratégia das classes dominantes brasileiras para monopolizar o poder político como condição sine qua non para seguir explorando o povo e espoliando a nação, em conluio com seus parceiros internacionais imperialistas
As classes dominantes brasileiras são inimigas da democracia, do progresso social, da divisão da propriedade, da renda, da justiça, da ascensão social dos trabalhadores e massas populares. Não aceitam reformas ou mudanças políticas e sociais que ponham em cheque os seus privilégios.
O mesmo se pode afirmar quanto ao seu posicionamento geopolítico da burguesia brasileira, que alterna a subordinação às potências imperialistas com um complexo de grande potência associada a essas mesmas forças internacionais, ambas atitudes contrárias a um alinhamento progressista no concerto internacional e ao desempenho de um papel proativo em favor da paz, da democratização das relações internacionais e da integração soberana da América Latina. É fenômeno patente e consolidado que a classe dominante brasileira é também antipatriótica, reserva estratégica dos planos de hegemonia mundial das potências imperialistas. Seus próprios interesses não são os nacionais e se acomodam maleavelmente às estratégias imperiais.
O golpe em marcha revela uma grande convergência de forças neoliberais e conservadoras. Partidos de variado espectro, exceto os de esquerda, em conluio com setores do Ministério Público, do Supremo Tribunal Federal e da Polícia Federal, ao consumar o golpe de Estado, infligem uma contundente derrota às forças progressistas e de esquerda.
Os neoliberais e conservadores criaram durante os últimos 13 anos uma espécie de condomínio oposicionista, que tomou sua forma mais acabada no segundo turno da última eleição presidencial e na atual ofensiva golpista, cuja gênese vinha de eleições e embates anteriores.
Nada mais elucidativo quanto à natureza da aliança golpista e da essência política e ideológica das forças que a integram do que a plena convergência programática. A “ponte para o futuro” de Michel Temer e a plataforma do PSDB, principal partido neoliberal, são faces da mesma moeda.
As forças golpistas, durante o governo interino que já dura mais de 100 dias, estão executando uma agenda de contrarreforma política, e promovendo a regressão antidemocrática do Estado brasileiro; a liquidação de conquistas sociais; a abertura total ao capital financeiro internacional; o retorno das privatizações; a submissão aos ditames do capital monopolista, com o qual assumiram o compromisso de promover a derrogação de leis que hoje asseguram os direitos sociais e trabalhistas; e o retrocesso civilizacional no âmbito da convivência social, dos direitos civis e dos direitos humanos. No plano diplomático, os golpistas estão liquidando as conquistas de uma política externa altiva e ativa, de integração regional, solidariedade e inserção do Brasil no mundo, a partir de uma visão contrária ao hegemonismo das grandes potências e a favor da paz mundial.
Independentemente do desfecho do ritual do impeachment no Senado, a luta política ingressa em nova etapa e se eleva a nível mais alto. Sem prejuízo da luta eleitoral e da ação institucional nos parlamentos e nos governos municipais e estaduais, emerge para o lugar primordial a luta política de massas, a organização popular, o fortalecimento das organizações dos movimentos populares e sindicais.
E – questão prioritária – entra na ordem do dia a construção da unidade das esquerdas e das forças progressistas, de que é embrião a Frente Brasil Popular, numa perspectiva ampla de unir todas as forças suscetíveis de serem unidas na defesa da democracia, do progresso social e da soberania nacional, em torno de um programa de resistência e luta que aponte tarefas imediatas e de médio e longo prazos, cujo escopo seja a realização de reformas estruturais democráticas e progressistas.
O empenho das forças de esquerda na realização desta tarefa será tanto maior quanto seja profunda a sua compreensão sobre por que ruiu a base de sustentação do governo. Será necessário soerguer um novo pacto político, uma frente progressista, e acumular forças para assegurar a hegemonia do campo democrático-popular e anti-imperialista. Desde o ângulo de análise e dos interesses dessas forças, é necessário formular uma estratégia e tática que escapem a qualquer tipo de adaptação à ordem neoliberal e conservadora.
Com clareza de objetivos, convicções programáticas, pensamento estratégico e sentido do momento histórico, a esquerda vê a crise atual e as novas condições desfavoráveis como uma etapa da luta. A nitidez com que se mostra a divisão entre os campos antagônicos da luta política, não anula, ao contrário reforça, a necessidade de combinar a firmeza e a combatividade com amplitude e flexibilidade táticas, sem ilusões nem confusão quanto ao caráter e aos objetivos estratégicos dos diversos sujeitos políticos.
A criminalização da esquerda, a ferocidade com que buscam ilegalizar o PT e excluir os comunistas da vida institucional, tornar o ex-presidente Lula inelegível, e submetê-lo, assim como a presidenta Dilma, a penas judiciais, inclusive a privação da liberdade, sinalizam o nível do ataque às forças progressistas. O que nos dá também a indicação das dimensões dos novos desafios.
A luta contra o golpe despertou a imensa consciência democrática e a capacidade de luta de milhões de brasileiros que aspiram à democracia, à justiça social e à soberania nacional, aos direitos humanos, à boa governança, à vida culta e a elevados padrões civilizacionais. Já tinha ocorrido o mesmo nos embates decisivos do segundo turno da eleição presidencial de 2014.
É uma energia acumulada cujo desenvolvimento terá uma dinâmica própria até se transformar na força motriz da realização das transformações de fundo inadiáveis, de sentido revolucionário, que está a exigir a sociedade brasileira.
O povo brasileiro agradece as manifestações de solidariedade de todos os povos irmãos e partidos amigos da região latino-americana e caribenha.
Fonte: Resistência
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