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segunda-feira, 11 de abril de 2016

O desinteresse pela política pode não ser sinal de isenção, mas de covardia

Até porque “o povo não acordou” em junho de 2013. Quem acordou foi uma parte dele. Outra parte nunca dormiu, afinal não tinha cama para tanto. No campo, marchas ainda reúnem milhares de pobres entre os mais pobres, que pedem terra plantar e seus territórios ancestrais de volta – grupos que são vítimas de massacres e chacinas desde sempre. Ao mesmo tempo, feministas, negros, gays, lésbicas, sem-teto sempre denunciaram a violação de seus direitos.

Eu gosto de cinismo. Bem dosado, cria uma casca que nos protege da insana realidade. Mas sabe o que acontece quando você exagera e diz que não importa nada do que façamos, tudo vai continuar igual? As coisas continuam iguais.
Tenho gases quando ouço o discursinho de que um município, um estado ou o país estão no fundo do poço e nada pode piorar.
Sim, Tiririca está errado. Por conta deste ofício de contador de histórias posso atestar que, no fundo do poço, tem um alçapão.
“Ah, você tá defendendo o governo!'' Não.
“Ah, você tá defendendo a oposição!'' Não.
“Ah, você tá sendo isentão!'' Afe… Não.
Eu estou defendendo o mínimo entendimento de história, esse campo do conhecimento tão esquecido.
Muitos desconhecem o valor das lutas que nos trouxeram até aqui. E, o pior, é que fomos nós mesmos que não fizemos muita questão de deixar isso claro. Pessoas não precisam ser mitificadas ao contrário do que acontece (heróis fedem), mas a luta coletiva travada não pode ser desprezada. Pois, se daqui em diante, novos caminhos podem ser trilhados é porque pessoas abriram uma estrada. Ou seja, o mundo não nasceu conosco e nem vai deixar de existir quando a gente for embora.
Até porque “o povo não acordou” em junho de 2013. Quem acordou foi uma parte dele. Outra parte nunca dormiu, afinal não tinha cama para tanto. No campo, marchas ainda reúnem milhares de pobres entre os mais pobres, que pedem terra plantar e seus territórios ancestrais de volta – grupos que são vítimas de massacres e chacinas desde sempre. Ao mesmo tempo, feministas, negros, gays, lésbicas, sem-teto sempre denunciaram a violação de seus direitos.
Eu gosto de cinismo. Bem dosado, cria uma casca que nos protege da insana realidade. Mas sabe o que acontece quando você exagera e diz que não importa nada do que façamos, tudo vai continuar igual? As coisas continuam iguais.
Em momentos de esgarçamento da democracia, o desinteresse pela política pode não ser sinal de isenção ou cansaço, mas de covardia. Estou, com isso, pedindo para todos tomarem partido pró ou contra o impeachment? Não. Apenas para que participem ativamente dos debates nesta semana, recolhendo argumentos, discutindo pontos de vista. Saibam, de verdade, o que está acontecendo. E, se assim decidirem, influenciem seus representantes políticos de acordo com a conclusão que tirarem diante de tudo isso. E não da conclusão que alguém te entregou de bandeja via WhatsApp.
Você acha cool se fazer de blasé diante da realidade? Acha ridículo o povo que se junta para debater política (os que fazem de forma civilizada, não os dodóis da cabeça que querem queimar gente na cruz) e os rumos do país? Tem nojinho de debate público? Crê que nada disso é útil e que melhor seria se cada um tocasse sua vida?
Não se engane: de tanto falar “Nada Adianta'', você tem tanta responsabilidade por fazer cumprir essa profecia quanto os representantes dos poderes econômico e político que fazem de tudo para que “Nada Adiante'' mesmo.
Sabe aquele mantra de que “religião e política não se discute''? Então, é cascata – e das mais grossas. Coisa de covarde. Pois é exatamente ao não discutir esses dois assuntos fundamentais para cotidiano que sacerdotes e políticos ganham liberdade para fazerem o que quiserem da vida alheia.
Ancoradas em nossa resignação, pessoas bisonhas tendem a ser eleitas para fazer rir indivíduos, empresas e organizações que os apoiam.
Sim, em última instância, somos nós os responsáveis pela bisonhice. Seja por ter votado neles (reproduzindo o que terceiros disseram sem a devida análise de quem são, o que defendem e com quem estão), seja por não ter votado neles mas também não tentado, ao menos, pautar a discussão sobre eles (quando temos certeza de que não farão um bom governo ou uma boa representação) ou , pior: não ter se interessado em saber o que faz um presidente, governador, senador ou deputado – ou se as opções que estão aí cumprem esse papel.
“Pô, mas política é chata demais.'' Bem, ela não precisa ser assim. Parece chata porque a construíram dessa forma. Invente sua maneira de fazer política, oras, tem muita gente fazendo isso. E, principalmente, não xingue quem está debatendo, isso trava tudo.
Afinal de contas, a saída para contrapor uma voz não é forçar o silêncio, mas sim outra voz. O silêncio dói, machuca. O diálogo é música. Sinto um amargo na boca quando vejo pessoas que, sob o risco de verem seus argumentos naufragarem em sua própria arrogância, tentam calar o outro. Ganhar no grito é prova de fraqueza intelectual e não de força.
Muita gente simplesmente repete mantras que lê na internet, ouve em bares ou vê na igreja e não para para pensar se concorda ou não realmente com aquilo. É um Fla-Flu, um nós contra eles cego, que utiliza técnica de desumanização, tornando o outro uma coisa sem sentimentos. Isso é muito útil durante momentos polarizados, com este, mas péssimo para o cotidiano.
Sugiro que busquem a tolerância no diálogo, mesmo que firme e duro, e ao questionarem o outro sobre as razões que o levam a determinada escolha, não tenha medo de colocar à prova a sua própria opção. Que se for forte o bastante, resistirá ao contato com outra ideia. Nossa natureza não é de certezas, mas de dúvidas e falhas que só conseguem ser mais bem percebidas nesse contato.
Por fim, quem rompe a barreira do conformismo e tenta debater política – independentemente do seu posicionamento – não raro é taxado como chato, babaca ou subversivo. Ainda mais se o debate for profundo. É obrigado a ouvir pérolas como “o seu argumento é muito longo, então é mentiroso, pois se fosse verdade, seria curto''. Meu Deus…
Caso tivéssemos essa necessária sensação de pertencimento do país em que vivemos, participaríamos realmente da vida política e perceberíamos o quão importante são semanas como esta em que decisões para as próximas décadas serão tomadas.
Mas o país, de fato, não nos pertence. Entregamos ele, há muito tempo, às indústrias de automóveis, às empreiteiras e às empresas de telefonia móvel, entre outras, que sabem do que a gente realmente precisa.
Então, por que discutir política? Compre, fique quieto e seja feliz.

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