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terça-feira, 8 de março de 2016

Amazônia Extrema: Queimadas e cheias afetam saúde dos ribeirinhos

Antônio Nobre, doutor em biogeoquímica do INPE, acredita que esse tipo de situação reforça a necessidade de uma ação imediata. Segundo ele, ainda que os estudos que relacionam desmatamento e os eventos climáticos estejam em andamento, é preciso começar agir desde já para evitar prejuízos maiores. “Na ciência, estamos tentando desenvolver um conhecimento para entender. Os povos nativos, não. Eles já tinham essa percepção. Os indígenas da Amazônia falavam assim: ‘será que o homem branco não sabe que, se tira a floresta, vai acabar chuva e se acabar a chuva, não tem nem o que beber e nem o que comer?’. Eles já sabiam disso. Nós precisamos tirar, ver que acabou a chuva e agora estamos aprendendo e falando: ‘precisamos recolocar a floresta’”.
Esta é a terceira parte da reportagem especial “Amazônia Extrema”, produzida pelo InfoAmazonia com texto de Camila Fróis e fotos de Flávio Forner. Será republicada aqui em quatro parte via parceria de conteúdo.
Veja aqui a parte 1 e parte 2.
Quais são as principais ocorrências de problemas de saúde que podem ser relacionadas aos eventos climáticos extremos? “Parte das doenças respiratórias podem ser atribuídas à baixa umidade e má qualidade do ar. Já as doenças transmitidas por vetor, como dengue ou malária, são causadas pela contaminação da água durante o evento das cheias”, afirma Christovam Barcellos, da Fiocruz. Acontece que o período denominado de “cheias” está relacionado não apenas ao nível dos rios, mas ao excesso de chuvas que provoca o acúmulo de água parada – onde o mosquito aedes aegypti se prolifera, implicando no crescimento dos casos da dengue.
Na visão do cientista, a saída para diminuir o impacto das mudanças climáticas na saúde das pessoas é evitar as queimadas. “É preciso de uma vez por todas acabar com o fogo, fumaça e fuligem na Amazônia. Já temos tecnologia com monitoramento de satélite para identificar os focos de incêndio e, inclusive, mapear as queimadas que acontecem em áreas de proteção ambiental. Agora, não adianta só saber onde está acontecendo. Tem que patrulhar essas áreas e prevenir os desastres que se repetem todos os anos”, analisa.

Darlison Andrade, analista do ICMBio, órgão que gerencia as unidades de conservação brasileiras, compartilha da inquietação de Christovam. Segundo ele, as unidades de conservação da Amazônia vivem literalmente um cerco de fogo, já que o órgão ambiental não tem competência para fiscalizar o entorno das áreas protegidas, onde começam as queimadas.
A proliferação do fogo é só um dos efeitos das secas abruptas ou prolongadas que também interferem no transporte, na pesca e na lavoura das comunidades. Em Jamaraquá, a mandioca brava usada para a farinha, principal carboidrato na dieta dos ribeirinhos, está secando debaixo da terra. Ari, morador da região, mostra que tentou plantar alguns pés esperando a ajuda da chuva que não veio: “Quem plantou, perdeu, porque não vai vingar. Nesta época já era para estar tudo cultivado, mas tem que esperar a hora que quiser começar a chover para trabalhar com a terra. Depois vai atrasar também pra colher. Quem não tiver estoque, vai ter que comprar”.
Na comunidade existem 24 n˙cleos familiares que possuem um estilo de vida regido pelo ritmo das ·guas do rio TapajÛs, ainda conservam uma simbologia arquitetÙnica ligada aos costumes de viver na regi„o em casas de moradia com rusticidade na construÁ„o, na maioria de palhas com parede de madeira, porÈm com energia elÈtrica da rede publica. FLAVIO FORNER/XIB…/INFOAMAZONIA
Mercearia da comunidade de Maripá. Foto: Flávio Forner/Infoamazonia
Antônio Nobre, doutor em biogeoquímica do INPE, acredita que esse tipo de situação reforça a necessidade de uma ação imediata. Segundo ele, ainda que os estudos que relacionam desmatamento e os eventos climáticos estejam em andamento, é preciso começar agir desde já para evitar prejuízos maiores. “Na ciência, estamos tentando desenvolver um conhecimento para entender. Os povos nativos, não. Eles já tinham essa percepção. Os indígenas da Amazônia falavam assim: ‘será que o homem branco não sabe que, se tira a floresta, vai acabar chuva e se acabar a chuva, não tem nem o que beber e nem o que comer?’. Eles já sabiam disso. Nós precisamos tirar, ver que acabou a chuva e agora estamos aprendendo e falando: ‘precisamos recolocar a floresta’”.
Os hóspedes de Pedrinho, em Jamaraquá, nem imaginam, mas o pescado servido com mandioca sob a sombra da árvore frondosa na margem do rio, pode estar com os dias contados: o rio está tão ruim pra peixe, que caboclos estão desistindo da pesca. Preferem ir comprar carne na cidade a ter que passar uma manhã inteira na canoa para garantir o almoço.
“Nos lagos é pior. Onde a água é parada, está tão quente que nem os peixes resistem”, conta o jovem Ildo Santos, 24 anos. Nos conduzindo por uma trilha no meio da mata, o morador explica que, na verdade, a maioria dos lagos da comunidade seca completamente durante o inverno. O problema é que, neste ano, muitos desapareceram antes do previsto, provocando a morte do pescado que poderia ter sido aproveitado pela população. “Todo ano, antes de secar outubro, a gente vem aqui e pega os peixes pra armazenar, mas este ano foi rápido demais e quando a gente chegou, em setembro, já tinha morrido tudo”, lembra Ildo, enquanto caminha no fundo do que seria um lago.

Para Patrícia Pinho, a mudança de padrão dos eventos climáticos provoca essa falta de previsibilidade, criando nos moradores uma incerteza sobre o sistema ecológico que rege a Amazônia. Com as alterações abruptas no regime de chuvas, os ribeirinhos já não sabem exatamente quando plantar, a melhor época para a pesca ou quanto de farinha precisam estocar para evitar imprevistos.
A pesquisadora reforça que os efeitos dos extremos climáticos são agravados por ações antrópicas, como a pesca predatória. Embora a Floresta Nacional do Tapajós seja uma unidade de preservação ambiental, o Rio Tapajós, que dá nome à floresta, não faz parte da área de proteção.

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