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quarta-feira, 31 de março de 2021

Manifestantes pedem intervenção militar em atos esvaziados no aniversário do golpe de 1964



Manifestantes se aglomeraram para pedir intervenção militar em São Paulo e no Rio de Janeiro em atos esvaziados nesta quarta-feira, 31 de março, aniversário de 57 anos do golpe que instaurou a ditadura militar do Brasil. Bate-boca, insultos e até tapas foram registrados durante aos atos. Nos últimos dias, mensagens de grupos bolsonaristas convocando atos em todo o País circularam nas redes sociais, mas, até o início da tarde desta quarta, não houve registro de grandes manifestações.

Em São Paulo, o ato ocorreu na frente do Comando Militar do Sudeste, ao lado da Assembleia Legislativa do Estado. Um grupo de manifestantes tentou forçar a entrada dentro do quartel e foi contido pelos militares. O ato começou por volta das 9h e reuniu cerca de 100 manifestantes, muitos sem máscara e sem respeitar o distanciamento social recomendado para evitar a propagação do coronavírus. Eles defendiam intervenção militar com Bolsonaro no poder e gritavam palavras de ordem contra o comunismo.

O grupo ainda questionou a eficácia das vacinas contra um covid-19 e defensor do uso de medicamentos sem eficácia comprovada. Um segundo grupo de manifestantes que se identificou como ligado à igreja católica puxou um minuto de silêncio em respeito à morte do policial militar baiano que foi morto durante um surto sem qual atirou contra seus colegas . Um dos manifestantes afirmou que ele "sua vida pelo povo".

No Rio, o ato aconteceu na orla de Copacabana. Defensores de uma nova intervenção insultaram e agrediram um jovem que contestava a manifestação. Ele foi cercado e empurrado, chegou a levar tapas aos gritos de "vai pra Cuba", "maconheiro" e outras ofensas de caráter homofóbico. Uma das faixas no ato, que reuniu cerca de 100 pessoas no fim da manhã, a pedia que Bolsonaro acionou as Forças Armadas para "auxiliar o povo na defesa da liberdade e das garantias constitucionais". Apesar de motoristas buzinarem em apoio aos manifestantes, muitas pessoas o contestaram. Bolsonaro foi chamado de "genocida", e gritos pró-democracia foram ouvidos.

Manifestantes pedem intervenção militar em atos esvaziados no aniversário do golpe de 1964; nenhum vídeo gravado no Rio, um cidadão é hostilizado por criticar o ato e defensor da democracia. https://t.co/boU2cpS0UU pic.twitter.com/W9DYp8wMhs - Política Estadão (@EstadaoPolitica) 31 de março de 2021

Outras capitais, como Belém e Curitiba, também registraram atos esvaziados. Em Belém, uma Polícia Militar dispersou os manifestantes que se aglomeravam em frente ao Quartel-General.

Apesar de a hasthtag # Viva31demarco e o termo "Viva 64" aparecerem desde o início desta quarta, 31, nos trending topics do Twitter, críticas à ditadura e celebrações do aniversário do golpe foram maioria. Até às 13h, cerca de 170 mil tweets com uma hashtag #DitaduraNuncaMais foram publicados, segundo números da própria plataforma. Menos de 90 mil publicaram uma tag que celebra o golpe. Ulysses Guimarães e trechos de seu discurso na promulgação da Constituição em 1988 também estão entre os temas mais comentados desta quarta.

Lideranças políticas incorporam o debate na rede social para se manifestar a favor da democracia. "O dia 31/03 não comporta a exaltação de um golpe que lançou o país em anos de uma ditadura violenta e autoritária", escreveu o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal . "É o momento de exaltar o valor da nossa democracia conquistada com suor e sangue. Viva o Estado de Direito."

O dia 31/03 não comporta a exaltação de um golpe que lançamento do país em anos de uma ditadura violenta e autoritária. Ao contrário: é o momento de exaltar o valor da nossa democracia conquistada com suor e sangue. Viva o Estado de Direito. #DitaduraNaoSeComemora - Gilmar Mendes (@gilmarmendes) 31 de março de 2021

Os presidenciáveis ​​como Ciro Gomes (PDT), Guilherme Boulos (PSOL) e Luciano Huck (Sem partido) também fizeram questão de se pronunciar. "Rupturas institucionais, como o golpe de 64, são retrocessos inaceitáveis", escreveu Huck. Partidos de espectros diferentes destacaram que o autoritarismo pós-1964 foi resultado das decisões dos militares. "O movimento militar de 1964 foi um golpe do Estado e assim está registrado na história", publicou o PSDB. "Os que negam o autoritarismo instalado pela ditadura são os que hoje negam a catástrofe do combate à pandemia", escreveu o PT.

Um dos perfis no Twitter que mais tem movimentado a hashtag que celebra o 31 de março é o do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB), aliado do presidente Jair Bolsonaro. "Você quer conhecer o futuro? Então olhe para o passado. Veja se não são parecidas como táticas de hoje para desestabilização do País com as que eram usadas em 1964", escrito o ex-deputado, pivô do escândalo do mensalão.

https://publish.twitter.com/?query=https%3A%2F%2Ftwitter.com%2FLatuffCartoons%2Fstatus%2F1377321722920177664&widget=Tweet Fonte: Estadão

Pró-Esia - Fábrica de Versos... Manu Chao, crônica do astro que virou as costas ao sistema

O cantor, que desapareceu renegando da fama, prefere atuar em bares, apoia causas minoritárias e dá canções de presente. Nos últimos dias, o coronavírus o devolve à atualidade

Aconteceu num dos momentos culminantes da sua carreira, depois de concluir a etapa do Mano Negra e logo antes de publicar seu primeiro disco solo, Clandestino. Era julho de 1998 e Manu Chao (Paris, 58 anos) havia embarcado num projeto chamado La Feria de las Mentiras, um festival que reunia malabaristas, DJs, shows, teatro… Um projeto ambicioso que precisou de meses de preparação e uma zelosa tarefa de contabilidade para que não fosse deficitário. Optou-se por desenvolvê-lo em Santiago de Compostela, no Mercado de Gado de Salgueiriños.

Aconteceu num dos momentos culminantes da sua carreira, depois de concluir a etapa do Mano Negra 
e logo antes de publicar seu primeiro disco solo, Clandestino. Era julho de 1998 e Manu Chao (Paris, 58 anos) havia embarcado num projeto chamado La Feria de las Mentiras, um festival que reunia malabaristas, DJs, shows, teatro… Um projeto ambicioso que precisou de meses de preparação e uma zelosa tarefa de contabilidade para que não fosse deficitário. Optou-se por desenvolvê-lo em Santiago de Compostela, no Mercado de Gado de Salgueiriños. Milhares de pessoas tinham comprado o ingresso por 5.000 pesetas (30 euros, 172 reais pelo câmbio atual). O recinto estava cercado, e uma empresa de segurança foi contratada para controlar os acessos. Mas alguns encontraram um lugar pouco vigiado. Alguns minutos depois do começo do show, Manu Chao estava lá, ajudando um grupo de penetras. O chefe boicotando a si mesmo. Empurrava uma das cercas e estimulava fãs a entrarem mesmo sem terem passado pela bilheteria. “Venham, venham, rápido, passem.” Os espectadores furtivos nem reconheceram o cantor, com a cabeça encapuzada. Passaram-se mais de duas décadas daquilo, e desde então Manu Chao só acentuou este espírito indômito, temerário e contraditório.

Nos últimos dias, fez algo que andava evitando neste século: equiparar-se a astros como Alejandro Sanz ou Bon Jovi. Como: publicando um vídeo com canções para aliviar o confinamento das pessoas. Com esta ação generosa, o cantor recordou ao público maciço que continua aí, que não está desaparecido. Embora, na verdade, sempre tenha estado ativo, mas esquivando o sistema.

Manu Chao não tem gravadora; não faz turnês como as dos artistas de sua categoria; tem ofertas para tocar nos melhores festivais do mundo, mas não quer; não se interessa por entrevistas; não lança discos; não aparece para receber prêmios; não usa celular…

Tudo isso não o impede de estar fazendo coisas o tempo todo. Você pode encontrá-lo atuando num bar de bairro, sem avisar, ou camuflado com outro nome. Ou escutar suas novas canções em seu site. O artista foi apanhado pela mano negra do coronavírus enquanto fazia uma turnê pela Índia, Bangladesh, Sri Lanka, Filipinas… Salas pequenas e em formato acústico de trio. Quando a coisa ficou feia, conseguiu chegar ao seu apartamento de Barcelona, de onde está gravando canções que publica em suas redes sociais com o nome de Coronarictus Smily Killer Sessions. Algumas são versões de canções dele (Otro Mundo), de outros, como Kiko Veneno (Echo de Menos), ou temas que aparentemente são novos (Mi Libertad).

Certamente não existe um músico nos últimos anos como ele, capaz de dar as costas ao sistema quando poderia tirar tantas coisas dele. Chao foi um campeão de vendas em nível mundial no final dos anos noventa, com discos como Clandestino (1998) e Próxima Estación, Esperanza (2001), que juntos despacharam quatro milhões de cópias. Chao lapidou aquela música bastarda de seu ex-grupo Mano Negra, acelerada e desordeira, e propôs algo mais pausado, melancólico. Reggae, rumba, ritmos latinos… para um disco, Clandestino, canônico no que se chamou de mestiçagem. Crucial a parte da mensagem, resumida em duas ideias que repetiu naqueles anos: “Tudo é mentira” e “Vivemos a ditadura da economia”.

“São canções simples, mas há muita verdade e sinceridade. Manu utiliza as palavras adequadas. Tudo parece fácil, mas tem uma grande complexidade”, observa a cantora Amparo Sánchez, cujo projeto musical mais conhecido é o Amparanoia. Sánchez colabora com Chao há 25 anos. “É um artista crucial para entender o devir do rock na América Latina durante os anos oitenta e noventa. Também é um entroncamento entre a música europeia e africana. Sua marca é crucial e indiscutível”, afirma o jornalista Bruno Galindo, que compartilhou com Chao uma longa viagem pelo Brasil.

Mas Manu Chao viu as longas garras da fama chegarem perto demais e fugiu. As encontrou, olhou-as de frente e lhes disse: “Não me quero sentir como um boneco numa tempestade”. A troco de quê? “Em um sentido mais amplo, a troco de liberdade”, afirma Kike Babas, autor, com Kike Turrón, do recente Manu Chao. Ilegal. Perseguiendo el Clandestino (Bao Bilbao Ediciones). “A missão de Manu é viver a vida, viajar, não cair na rotina. Um de seus exemplos é Bob Marley. Acredito que Manu vive e sente a vida como Marley”, afirma Turrón.

Amparo Sánchez recorda como começou sua relação com Chao. “Era 1995 e eu acabava de chegar a Madri. Tinha 25 anos. Costumava ir pela rua Madera [no centro] para ensaiar carregando meu violão e o tripé do microfone. E sempre cruzava com um sujeito pequeno que me cumprimentava. Eu era fã do Mano Negra, mas não reconhecia Manu quando me dizia ‘olá’. Um dia decidimos tomar uma cerveja em um bar da praça Dos de Mayo. Falamos por três horas. Contou-me suas viagens pela América Latina, as causas sociais que lhe pareciam interessantes… Mas eu continuava sem localizá-lo e ele não disse nada. Ao ir embora me comentou que tinha um grupo e que ensaiavam num porão próximo, que passasse por lá um dia. E passei. Abriu ele mesmo a porta e percebi que era o Mano Negra.”

Nascido em Paris de pai galego (Ramón) e mãe basca (Felisa), Manu Chao não se interessava muito pelos livros que enchiam a sala da sua casa de classe média. Preferia a rua. Ramón Chao (Lugo, 1935 – Barcelona, 2018), seu pai, era um jornalista e escritor que trabalhava para veículos como o Le Monde e recebia prêmios literários. Os dois filhos do casal, Antonie (nascido em 1964) e José Manuel, o Manu (em 1961), começam de adolescentes a tocar rock. Manu forma bandas como Hot Pants e Los Carayos… e o Mano Negra, junto com seu irmão, que começou em 1987 com sua mistura de punk, ska e ritmos latinos e se manteve num caminho ascendente em popularidade até sua dissolução em 1997.

A ruptura do Mano Negra, que acabou em julgamento, destroçou Chao. “Foi uma etapa de grande desânimo. Inclusive ele cogita deixar a música. O final do grupo lhe causou muito desgaste e a isto se uniu uma separação sentimental. Deprime-se. Pensa em virar trabalhador social na África ou em seguir os passos do seu pai e virar jornalista”, afirma o escritor Kike Babas.

Chao opta por uma viagem terapêutica pela América Latina que lhe salvaria tanto emocional como criativamente. Conhece sua namorada no Brasil e se nutre dos ritmos latinos. Toda esta melancolia latina será o arcabouço de Clandestino, que grava ao regressar à Espanha. “O sucesso de Clandestino nos pegou de surpresa. Não o esperávamos na gravadora, e acho que Manu tampouco. Ele sempre foi muito honesto, um músico que se nutre do bairro, que prefere tocar com músicos desconhecidos que conhece num bar a tocar com grandes nomes”, conta Javier Liñán, a pessoa de confiança do franco-espanhol em sua etapa na multinacional Virgin. O disco vendeu milhões de cópias. Música em espanhol acotovelando-se com os que triunfavam naquela época: Britney Spears, NSYNC, Eminem, Limp Bizkit…

Sagrario Luna conhece Manu Chao desde que formou o Hot Pants, no final dos anos oitenta. “Lembro que naquela época só falava de Chuck Berry e Camarón e usava um pequeno topete”, comenta. Depois trabalhou com ele em turnês e na Virgin. “Era trabalhar com um colega”, observa. “Durante muito tempo, ser Manu Chao pesou muito para Manu Chao. Depois do sucesso de Clandestino, todo mundo lhe pedia opinião sobre tudo, e acho que isso lhe gerou muita frustração”, diz Luna. E acrescenta: “Sempre me pareceu um sujeito de verdade. Tem nuances, como todos, mas nunca foi falso. Por outro lado, o achava bastante solitário, com poucos amigos, dos quais, isso sim, cuidava muito”. O discurso de Chao naquela época tem tintas de visionário. Alerta sobre o populismo xenófobo, o integralismo religioso, a morte do formato físico na música. E cria um movimento ao redor dele. Assim o definiu Fermín Muguruza, músico que também colaborou com o artista: “Formou-se uma rede internacional do rock em que estavam todos remando para conseguir um mundo melhor”.

Para entender a posição fora de foco atual do músico, é preciso revisar dois episódios de sua vida, decepções que tiraram a pouca fé que ele tinha no establishment. Uma delas é com Iggy Pop, um músico a quem Chao admirava… até que o Mano Negra abriu um show do líder dos Stooges. Assim contou ele certa vez à revista Tentaciones, do EL PAÍS: “Com Iggy Pop aprendemos a dura lei de show-business. Boicotaram o nosso som, proibiram o pessoal do catering de nos dar de comer, às vezes até nos proibiram de tocar. E, no final, o numerozinho. Quando alguém da segurança – às vezes o próprio filho do Iggy, que trabalhava na turnê – empurrava alguém que tentava subir ao palco, Iggy dizia: Ei, você, seu filho de puta, não toque no meu público!’. E toda a plateia pensando: ‘Que cara mais maneiro é o Iggy’”.

E o segundo episódio tem a ver com seu compromisso social. Em julho de 2001 o cantor vai a Gênova (Itália) para protestar, com muitos milhares mais, durante a reunião dos países mais poderosos, o G-8. O anfitrião é Silvio Berlusconi, à época primeiro-ministro italiano. Chao atua e no dia seguinte participa, esmurrando um tambor, de uma grande manifestação contra a política do G-8. E vai embora para a França. No dia seguinte, o caos. Um grupo de manifestantes violentos entra em ação, e a polícia italiana revida com força. As imagens corem o mundo, com manifestantes pacifistas envoltos num furacão de violência. Chao vê tudo pela televisão da sua casa, em Paris, e fica horrorizado.

Muitos o reclamam como o líder antiglobalização que as ruas necessitam. Ele primeiro fala. “Esse movimento não necessita de líderes, se houver líderes é nefasto para o movimento. Essa etiqueta do líder do movimento eu rejeito”, afirma numa entrevista coletiva em Valência, antes de um show, em setembro de 2001. E, nos anos seguintes, reluta a todo custo em aparecer no noticiário. Procura batalhas antimidiáticas, lutas de pequenas comunidades. Como as reivindicações salariais das trabalhadoras do Serviço de Atendimento Domiciliar (SAD) de Barcelona; em Mendoza (Argentina), para apoiar que não se permita o fracking e a mineração em grande escala; incentivando as chamadas kellys (camareiras de hotéis); em defesa do povo mapuche; ao lado dos migrantes; contra a multinacional Monsanto… Aparece sempre com seu violãozinho, vestido com suas eternas calças corsário e com seu perene sorriso desenhado no rosto. Chao escuta, canta e apoia economicamente. Não sai na imprensa, poucos ficam sabendo.

“Manu se dói pelo mundo. E se acalma indo aos lugares e apoiando causas pequenas que considere justas. Em seus shows grandes, sempre deixa um lugar para que estes coletivos se expressem. Em um momento dado do show, para e sobem ao palco para se expressarem, como ocorreu em 2016 na Plaza Mayor de Madri”, diz Kike Babas, que foi o contato entre o artista e a equipe de Manuela Carmena, então prefeita da capital, para celebrar o recital. “Quis estar em Madri porque depois de muitos anos na capital se respiravam outros ares. Mas deixou muito claro que não queria que o vinculassem nem com algum partido político nem com o [movimento de indignação popular] do 15-M”, diz Babas.

Quem compartilha vivências com ele salienta seu caráter austero: “Quando você se senta para comer com ele, não há dois pratos e sobremesa. Você só belisca”; “o lugar mais incômodo onde já dormi na minha vida foi com o Manu: em um povoado do Brasil, numa espécie de armário; “compra roupas em lojas de segunda mão”… Amparo Sánchez conta uma história curiosa a respeito: “Manu já era uma estrela, mas recordo que quando marcávamos de nos encontrar ficávamos sentados na porta de um prédio, com cigarros e uma cerveja, e ali passávamos as horas falando”. O artista pode se permitir esta vida errante e livre de grilhões (familiares, profissionais…) porque sua conta corrente é generosa. “As vendas de seus dois primeiros discos solo e os direitos autorais são suficientes para que ele e sua descendência vivam de forma bastante folgada”, diz uma fonte. A julgar pelas canções que publica em seu site, não se vislumbra uma evolução musical. “Não acredito que precise nem que a busque. Interessa-se pela cultura popular, pelo bairro, pelo músico que trabalha na rua”, aponta Liñán.

Sua casa em Barcelona tem 80 metros quadrados e é uma espécie de oficina de trabalho, com um computador, lembranças dos lugares por onde viaja e, num canto, um catre “que não parece muito cômodo”. Passa ao menos uma vez ao ano pelo Brasil, onde vive, no Ceará, seu único filho, Kira, que já tem mais de 20 anos.

No ano que vem Manu Chao completará 60 anos. Manteve-se sempre afastado das drogas duras: preferiu fumar maconha e beber licores depois da refeição, mas de forma comedida. Conserva-se juvenil. É pequeno, magro e fibroso. Corre, joga futebol e se mexe, sempre se mexe. Sua última canção confinada se chama Mi Libertad. Diz assim: “Minha liberdade, minha companheira, minha liberdade, minha solidão”.

Fonte: El País

terça-feira, 30 de março de 2021

Chefes das Forças Armadas renunciam: "Não vamos participar de aventura golpista"

Comandantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica deixam seus postos em protesto contra Bolsonaro. Pela primeira vez na história, os três comandantes das Forças Armadas pediram renúncia conjunta por discordar de um presidente da República

O Ministério da Defesa informou nesta terça, dia 30, que os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica deixaram seus cargos. Eles estavam reunidos desde o início da manhã para deliberar sobre a demissão conjunta.

O Ministério da Defesa informou nesta terça, dia 30, que os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica deixaram seus cargos. Eles estavam reunidos desde o início da manhã para deliberar sobre a demissão conjunta.
A decisão foi tomada em uma reunião realizada nesta terça em Brasília, com Braga Netto, novo Ministro da Defesa, e do ex-ministro Fernando Azevedo, que deixou o cargo nesta segunda, dia 29.
Entenda a crise
Edson Leal Pujol (Exército), Ilques Barbosa (Marinha) e Antônio Carlos Bermudez (Aeronáutica) colocaram seus cargos à disposição do general da reserva Walter Braga Netto, novo ministro da Defesa, nesta manhã.
Braga Netto tentou dissuadi-los de seguir o seu antecessor, o também general da reserva Fernando Azevedo, demitido por Jair Bolsonaro na segunda-feira (29).
O mal-estar pelo anúncio inesperado da saída de Azevedo, que funcionava como pivô entre as alas militares no governo, o serviço ativo e o Judiciário, foi grande demais.
O motivo da demissão sumária do ministro foi o que aliados dele chamaram de ultrapassagem da linha vermelha: Bolsonaro vinha cobrando manifestações políticas favoráveis a interesses do governo e apoio à ideia de decretar estado de defesa para impedir lockdowns pelo país.
O presidente falou publicamente que “meu Exército” não permitiria tais ações. Enquanto isso, foi derrotado no Supremo Tribunal Federal em sua intenção de derrubar restrições em três unidades da Federação.
Enfrentar medidas de governadores para tentar restringir a circulação do novo coronavírus, que já matou 310 mil pessoas, é a obsessão do presidente. O presidente acredita que lockdowns e afins dificultarão ainda mais seus planos de reeleição.
Bolsonaro também queria que o comandante do Exército se manifestasse publicamente contra o STF, em tom de ameaça, após os ministros da Suprema Corte decidirem pela elegibilidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Uma entrevista do general responsável pelo RH do Exército sobre a pandemia também desagradou Bolsonaro (veja aqui).
“Foram degolados”
Na avaliação do jornalista Fernando Brito, o comandantes das Forças Armadas foram ‘degolados’ por Braga Netto a mando de Bolsonaro.
“A nota lacônica do Ministério da Defesa dá a entender que eles não se demitiram, foram exonerados dos seus comandos. Não houve nem mesmo o cuidado de alegar uma necessidade de readequar os comandos ao novo Ministro da Defesa. É um sinal de ‘enquadramento’,” afirma.
Braga Neto sinaliza que não terão lugar nas Forças os que não concordarem com a submissão total a Jair Bolsonaro. Cumpriu, sem muita cerimônia, a ordem de degolar os três comandantes, sem sequer uma frase de agradecimentos ou elogios ao seu serviço. Nunca as Forças Armadas brasileiras foram tão espezinhadas por um Presidente, jamais foram tratados com tão pouca dignidade”, acrescenta.
Veja a nota divulgada pelo Ministério da Defesa:
Ministério da Defesa
Centro de Comunicação Social da Defesa
Nota oficial
Brasília, DF
Em 30 de março de 2021
O Ministério da Defesa (MD) informa que os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica serão substituídos.
A decisão foi comunicada em reunião realizada nesta terça-feira (30), com presença do Ministro da Defesa nomeado, Braga Netto, do ex-ministro, Fernando Azevedo, e dos Comandantes das Forças.
Ao deixarem seus cargos, todos reafirmaram na reunião com Braga Netto que os “militares não participarão de nenhuma aventura golpista”. É a primeira vez na história que os três comandantes das Forças Armadas pedem demissão conjunta por discordar de um presidente da República.

segunda-feira, 29 de março de 2021

Legalização da maconha cria mercado promissor e visa a reparar injustiças em Nova York

Além de receita anual de US $350 milhões ao estado, acordo prevê a destinação de 40% dos lucros para comunidades que sofreram impacto na guerra contra as drogas.

Mais do que assegurar a receita anual de US$ 350 milhões em arrecadação de impostos ao estado, o acordo fechado entre líderes legislativos para o uso de maconha recreativa em Nova York visa a reparar as disparidades nas comunidades afetadas pela prolongada guerra contra as drogas. Estatísticas mostram que os negros são presos por porte de maconha numa proporção de 15 vezes maior em relação aos brancos na cidade de Nova York. Entre os hispânicos, o número é cinco vezes maior.

Mais do que assegurar a receita anual de US$ 350 milhões em arrecadação de impostos ao estado, o acordo fechado entre líderes legislativos
 para o uso de maconha recreativa em Nova York visa a reparar as disparidades nas comunidades afetadas pela prolongada guerra contra as drogas. Estatísticas mostram que os negros são presos por porte de maconha numa proporção de 15 vezes maior em relação aos brancos na cidade de Nova York. Entre os hispânicos, o número é cinco vezes maior.

Veja uma reportagem de 2019 sobre o imposto arrecadado no Canadá com a venda de maconha.https://g1.globo.com/globonews/jornal-globonews-edicao-das-10/video/canada-lucrou-us-139-milhoes-com-o-comercio-de-maconha-7706960.ghtmlSe o projeto de lei for aprovado nos próximos dias pelo Legislativo estadual, que tem maioria democrata, cerca de 40% dos lucros com a venda de cannabis serão revertidos para as comunidades carentes que mais sofreram o impacto de perseguições pela criminalização das drogas.

Elas serão as primeiras da fila a obter benefícios econômicos, resumiu, num comunicado, a entidade The Legal Aid Society, a mais antiga dos EUA a oferecer assistência jurídica gratuita: “Ao acabar com a proibição, a legislação histórica traz justiça ao estado de Nova York, suspendendo registros de condenação, que reduziram as oportunidades a jovens negros e latinos nova-iorquinos.”

Com a legislação aprovada, o estado segue os passos de Nova Jersey e será o 15º dos EUA, além do Distrito de Columbia, a afrouxar as restrições à maconha, eliminando a prisão para os que portam a quantidade da droga inferior a 85 gramas.

Um imposto de 13% sobre as vendas de maconha, apenas aos maiores de 21 anos, recairá para a receita estadual e local, revertido ainda para fundos de educação e de tratamento para usuários de drogas.

Pressionado por investigações por assédio sexual e por tentar dados de mortes de idosos por Covid-19 em asilos, o governador Andrew Cuomo tenta limpar a imagem e salvar a própria pele.

Opositores o acusam de tentar distrair a opinião pública, mas a batalha pela legalização da maconha é anterior aos escândalos: foi longa e enfrentou vários percalços. A movimentação do promissor mercado, com expectativa para criar entre 30 mil e 60 mil empregos, ajudará também a sanear as contas do estado, que acumulou o déficit de US$ 15 bilhões com a pandemia do novo coronavírus.

Fonte: G1

Governador explica funcionamento de Lojas Zema na onda roxa

“Eu quero esclarecer que, há quase cinco anos, eu não participo da gestão das mesmas [Lojas Zema]. Segundo: a maioria dessas lojas, pelo que eu sei, são correspondentes bancários que recebem conta, e assim são tratadas. E terceiro: elas operam com e-commerce e têm o trabalho de retirada de mercadoria dentro delas”, explicou Romeu Zema em stories publicados no Instagram.

O governador de Minas Gerais, Romeu Zema (Novo), usou as redes sociais nesta quinta-feira (25) para comentar as denúncias de que algumas unidades das Lojas Zema estavam funcionando no estado, mesmo durante a onda roxa – fase de restrições mais rígidas impostas pelo Governo mineiro. 
O governador esclareceu alguns motivos pelos quais os estabelecimentos podiam estar abertos, mas reforçou que, em caso de irregularidades, a população deve denunciar a loja.
“Eu quero esclarecer que, há quase cinco anos, eu não participo da gestão das mesmas [Lojas Zema]. Segundo: a maioria dessas lojas, pelo que eu sei, são correspondentes bancários que recebem conta, e assim são tratadas. E terceiro: elas operam com e-commerce e têm o trabalho de retirada de mercadoria dentro delas”, explicou Romeu Zema em stories publicados no Instagram.

“Mas deixo claro aqui: não aceito privilégio. Se alguém, inclusive essas lojas, estiver operando de forma inadequada, denuncie na polícia, denuncie na prefeitura. Nós estamos vivendo um momento em que todos têm de contribuir”, completou o governador. O serviço prestado pelas Lojas Zema de correspondente bancário, por meio do qual as pessoas podem pagar contas, pode se enquadrar na lista de atividades permitidas na onda roxa como “agências bancárias e similares”.

Denúncias

Nas redes sociais, circulam fotos e vídeos que mostram lojas da rede, em diferentes cidades de Minas, abertas em meio ao comércio fechado por determinação da onda roxa do programa Minas Consciente. Em um dos vídeos, filmado por um morador de Manhumirim, na região da Zona da Mata, é possível ver duas pessoas circulando no interior do estabelecimento.

“Queria que vocês vissem isso aqui, a loja funcionando a pleno vapor, mesmo com decreto de lockdown imposto por ele por uma medida muito mais política do que sanitária. Está aí funcionando, as pessoas entrando, saindo. Infelizmente, este é o país em que a gente vive. A lei só funciona para alguns. Queria que este vídeo chegasse ao governador para ele explicar para a sociedade por que as lojas dele estão funcionando, sendo que os demais comerciantes têm que manter tudo fechado”, diz o homem que grava o vídeo.

Onda roxa


A fase de restrições ainda mais rígidas foi anunciada no início deste mês – até então, as regiões com cenários mais graves eram enquadradas na onda vermelha, que não impunha restrições de circulação, por exemplo. Agora, no entanto, os municípios podem avançar para um estágio ainda mais grave, e, nesse caso, são colocados na onda roxa – é o caso, neste momento, de todas as cidades mineiras. A medida, com determinações rigorosas, foi criada diante do risco de um colapso do sistema de saúde.

Entre as restrições previstas pela onda, está a proibição de circulação de pessoas que não se deslocam para atividades essenciais; o toque de recolher das 20h às 5h; a proibição de reuniões presenciais, inclusive de pessoas da mesma família que não moram juntas; entre outras. Já os cultos religiosos permanecem autorizados em Minas. Confira o que está vetado em todo o estado:

  • Circulação de pessoas e veículos pra atividades não-essenciais;
  • Circulação de pessoas sem máscara em qualquer espaço público ou coletivo, ainda que privado;
  • Circulação de pessoas com sintomas de gripe, exceto para realização ou acompanhamento de consultas e exames médicos e hospitalares;
  • Realização de reuniões/eventos presenciais, inclusive entre pessoas da mesma família que não moram juntas;
  • Qualquer tipo de evento público ou privado que possa provocar aglomeração;
  • Funcionamento de bares e restaurantes (permitido somente para delivery)

Quais são as atividades essenciais?


De acordo com o Governo de Minas, são consideradas atividades essenciais na onda roxa:

  • setor de saúde, incluindo unidades hospitalares e de atendimento e consultórios;
  • indústria, logística de montagem e de distribuição, e comércio de fármacos, farmácias, drogarias, óticas, materiais clínicos e hospitalares;
  • hipermercados, supermercados, mercados, açougues, peixarias, hortifrutigranjeiros, padarias, quitandas, centros de abastecimento de alimentos, lojas de conveniência, lanchonetes, de água mineral e de alimentos para animais;
  • produção, distribuição e comercialização de combustíveis e derivados;
  • distribuidoras de gás;
  • oficinas mecânicas, borracharias, autopeças, concessionárias e revendedoras de veículos automotores de qualquer natureza, inclusive as de máquinas agrícolas e afins;
  • restaurantes em pontos ou postos de paradas nas rodovias;
  • agências bancárias e similares;
  • cadeia industrial de alimentos;
  • agrossilvipastoris e agroindustriais;
  • telecomunicação, internet, imprensa, tecnologia da informação e processamento de dados, tais como gestão, desenvolvimento, suporte e manutenção de hardware, software, hospedagem e conectividade;
  • construção civil;
  • setores industriais, desde que relacionados à cadeia produtiva de serviços e produtos essenciais;
  • lavanderias;
  • assistência veterinária e pet shops;
  • transporte e entrega de cargas em geral;
  • call center;
  • locação de veículos de qualquer natureza, inclusive a de máquinas agrícolas e afins;
  • assistência técnica em máquinas, equipamentos, instalações, edificações e atividades correlatas, tais como a de eletricista e bombeiro hidráulico;
  • controle de pragas e de desinfecção de ambientes;
  • atendimento e atuação em emergências ambientais;
  • comércio atacadista e varejista de insumos para confecção de equipamentos de proteção individual – EPI e clínico-hospitalares, tais como tecidos, artefatos de tecidos e aviamento;
  • de representação judicial e extrajudicial, assessoria e consultoria jurídicas;
  • relacionados à contabilidade;
  • serviços domésticos e de cuidadores e terapeutas;
  • hotelaria, hospedagem, pousadas, motéis e congêneres para uso de trabalhadores de serviços essenciais, como residência ou local para isolamento em caso de suspeita ou confirmação de covid-19;
  • atividades de ensino presencial referentes ao último período ou semestre dos cursos da área de saúde;
  • transporte privado individual de passageiros, solicitado por aplicativos ou outras plataformas de comunicação em rede.
Fonte:BHAZ

Vereador de BH comete gafe ao confundir empresário com filho de Kalil

Segundo vereador mais votado de Belo Horizonte, Nikolas Ferreira (PRTB) usou as redes sociais para tentar atacar o prefeito da capital, Alexandre Kalil (PSD), mas acabou cometendo uma gafe constrangedora. O parlamentar confundiu um empresário famoso, que já foi noivo da atriz Mariana Rios, com um dos filhos do gestor municipal. O motivo? Os dois têm sobrenome Kalil.

Segundo vereador mais votado de Belo Horizonte, Nikolas Ferreira (PRTB) usou as redes sociais para tentar atacar o prefeito da capital, Alexandre Kalil (PSD), mas acabou cometendo uma gafe constrangedora. O parlamentar confundiu um empresário famoso, que já foi noivo da atriz Mariana Rios, com um dos filhos do gestor municipal. O motivo? Os dois têm sobrenome Kalil.
“Você não pode trabalhar e fazer atividade física, é obrigado a usar máscara se não toma multa, e até pode ser preso, mas o filho do Kalil pode quebrar tudo isso sem problema”, afirmou o vereador em um trecho do vídeo ao mostrar fotos do empresário Lucas Kalil Aluani, dono de uma imobiliária em São Paulo, que não tem parentesco próximo com o prefeito de BH.
Nikolas Ferreira ainda diz que “enquanto o prefeito de Belo Horizonte fecha a cidade toda, o filho dele tá curtindo uma praia”. “Então pro Kalil é assim: lockdown pra você e prainha pra minha família”, completou em gravação publicada no Instagram. Confira o vídeo – que já foi deletado – com as informações falsas:

Pedido de desculpas
Depois de perceber o equívoco, o vereador culpou o Google por ter atribuído as imagens do empresário Lucas Kalil na praia ao filho do prefeito Alexandre Kalil. “Fala, galera, eu tinha postado um reels [ferramenta do Instagram] aí mostrando o filho do Kalil… Quando você coloca no Google aparece Lucas Kalil filho de Alexandre Kalil, o avô é Elias Kalil, pai do Alexandre Kalil”, disse em um trecho. “Aí você pesquisa mais, aí tá lá família Kalil, Lucas Kali, Alexandre Kalil filhos, Lucas Kalil”, continuou.
O BHAZ tentou contato com o vereador Nikolas Ferreira, na noite de hoje (25), mas não teve as ligações atendidas. A reportagem também o procurou por meio do WhatsApp e aguarda retorno. A matéria será atualizada tão logo o legislador atenda as demandas.
Histórico
Nikolas Ferreira foi o segundo vereador mais votado de Belo Horizonte, atrás da professora e ativista Duda Salabert. Desde que foi eleito, já protagonizou diversas polêmicas. Em uma ocasião, ele exibiu um fuzil em um vídeo no Instagram e agradeceu Bolsonaro por ter a possibilidade de comprar a arma. Antes de se tornar parlamentar, Nikolas também participou de uma ação que terminou com uma placa em homenagem a Marielle Franco, vereadora assassinada no Rio de Janeiro, arrancada de uma praça localizada no bairro Floresta.
“Então, na verdade o Google me sabotou e é lógico, tem que ter humildade pra reconhecer o erro quantas vezes foram necessárias, não tem problema. Já deletei todos os vídeos, tudo certinho pra poder não manchar o nome do Lucas Kalil. Então o caso foi o próprio Google que me sabotou… Então, Lucas, pede pro Google tirar que você é filho do Alexandre Kalil, se não pode dar problema pra você”, completou.

Fonte: BHAZ

quinta-feira, 25 de março de 2021

Para essa jornalista filipina, todo dia é uma batalha assustadora

Um testemunho pessoal da jornalista filipina Inday Espina-Varona


Mulheres jornalistas, feministas, ativistas e defensoras dos direitos humanos em todo o mundo enfrentam assédio virtual. Nesta série, a aliança global de sociedade civil CIVICUS destaca a natureza de gênero do assédio virtual através de histórias de mulheres que trabalham para defender nossas liberdades democráticas. Esses testemunhos são publicados aqui por meio de uma parceria entre a CIVICUS e a Global Voices.

O ambiente para a sociedade civil nas Filipinas têm sido hostil desde que o presidente Rodrigo Duterte assumiu o poder em 2016. Assassinatos, prisões, ameaças e intimidação de ativistas e críticos do governo são frequentemente conduzidos impunemente. De acordo com as Nações Unidas, a repressão à dissidência tem sido “cada vez mais institucionalizada e normalizada de maneiras que serão difíceis de reverter”.

Também têm sido tomadas medidas duras e persistentes contra mídias independentes e jornalistas. Ameaças e ataques contra jornalistas, assim como a mobilização de exércitos de trolls e bots on-line, especialmente durante a pandemia de COVID-19, têm contribuído para autocensura – isso teve um efeito inibidor na indústria midiática e no público geral.

Uma tática cada vez mais usada pelo governo para atingir ativistas e jornalistas é classificá-los como “terroristas” ou “frentes comunistas”, particularmente aqueles que foram críticos à mortal “guerra às drogas” de Duterte que assassinou milhares. Conhecido como “marcação vermelha” nas Filipinas, esse processo frequentemente coloca ativistas em grave risco de serem visados pelo Estado e milícias pró-governo. Em alguns casos, aqueles que foram marcados foram mortos depois. Outros receberam ameaças de morte ou comentários sexualmente abusivos em mensagens privadas ou redes sociais.

Devido a uma impunidade descontrolada, a responsabilização por ataques contra ativistas e jornalistas é praticamente inexistente. Tribunais nas Filipinas falham em garantir justiça, e a sociedade civil tem exigido uma investigação independente sobre essas graves violações.

A jornalista filipina Inday Espina-Varona conta sua história:

“Ficar em silêncio seria se render à tirania”

O som de sinos tibetanos e a água corrente transformaram-se em um grande ruído na noite em que dezenas de amigos preocupados postaram no Facebook o meu rosto e uma manchete que gritava que eu estava passando informações a guerrilhas comunistas.

Bruxa velha, prostituta na menopausa, pessoa com “sexualidade confusa” – fui chamada de tudo isso nas redes sociais. Trolls, rotineiramente, pedem a minha prisão por ser comunista. Mas o ataque em 4 de junho de 2020 foi diferente. A página de direita, anônima, no Facebook, me acusou de terrorismo e de usar o acesso e a cobertura jornalísticos para passar informações militares sensíveis e confidenciais para rebeldes.

Aquela noite, meu jantar não passou de duas colheradas. Meu estômago parecia um saco cheio de pedras se agitando em volta de uma corrente maligna. Toda a minha coleção de música zen, horas observando as estrelas e muito óleo calmante ainda não conseguiam me fazer dormir.

Estranhos começaram a importunar no Messenger no dia seguinte. Um deles perguntou como era ser “a musa dos terroristas”. Outro disse “Maghanda ka na bruha na terorista” (“Prepare-se, sua bruxa terrorista”). Um terceiro disse, em linguagem vulgar, que eu deveria ser a primeira a levar um tiro na vagina, uma referência ao que o presidente Rodrigo Duterte disse certa vez aos soldados para fazerem com mulheres rebeldes.

Eu tenho 57 anos e sou uma sobrevivente de câncer com um problema crônico nas costas. Não perambulo por aí à noite. Não faço caminhadas no campo. Eu nem mesmo reporto assuntos militares. Mas, durante semanas, me senti como um alvo de tiro. Como passageira em veículos, deixei de navegar na internet no celular para observar os espelhos laterais e prestar atenção em motos com dois passageiros – frequentemente mencionadas em relatos sobre assassinatos.

Percebi que essa era uma ameaça maior. Esse ataque não era contra ideias ou palavras. A acusação envolvia ações penalizadas com prisão ou pior. Alguns oficiais militares a estavam compartilhando.

Nada surpreendente; o atual governo não se importa com detalhes factuais. Ele usa “comunista” como uma expressão geral para tudo que incomode o governo das Filipinas. Equipes anônimas mataram quase 300 dissidentes e esses ataques geralmente vieram depois de campanhas de marcação vermelha. Dezenove jornalistas também foram assassinados desde que Duterte assumiu o cargo em 2016.

Jornalistas, legisladores, defensores das liberdades civis e internautas denunciaram a mentira. Dezenas denunciaram o post. Eu também fiz isso. Todos nós recebemos uma mensagem automática: ele não violava os padrões de comunidade do Facebook.

Parece bobo discutir com um sistema automatizado, mas eu reuni as provas antes de entrar em contato com executivos do Facebook. Minha resposta normal a interações ofensivas no Facebook ou Twitter é um emoji sorrindo e o bloqueio. Ameaças são uma questão diferente.

Rastreamos a ameaça “Vamos ver o quanto você é corajosa quando a gente chegar na rua onde você mora”, e chegamos a um graduado em criminologia filipino trabalhando em um bar japonês. Ele pediu desculpas e apagou o comentário.

Depois que investiguei Duterte por culpar o uso de drogas em geral por estupro, alguém disse que meus “defensores viciados” deveriam ser punidos com o estupro de minha filha.

“Isso vai te ensinar”, dizia a mensagem de uma conta que não mostrava sinais de vida. Outro disse que viria para me estuprar. As duas contas tinham as mesmas características. Elas estavam ligadas a contas parecidas. O Facebook as bloqueou e fez o mesmo com o post e a página sobre “jornalista informante de rebeldes”.

A pressão popular para acabar com produtos de fazendas de trolls diminuiu a incidência de mensagens de ódio. Mas ainda há um aumento no número de páginas anônimas focadas na marcação vermelha, com policiais, oficiais militares e contas oficiais espalhando seus posts.

Descobriu-se que, na verdade, alguns oficiais eram os responsáveis por essas páginas. Quando o Facebook, recentemente, bloqueou diversas contas ligadas às forças armadas, oficiais do governo protestaram raivosos, com falsas acusações sobre “ataques à liberdade de expressão.”

Essa reação mostra a ligação entre atos não oficiais e oficiais, e plataformas no nosso país. Pode começar com desinformação nas redes sociais e então ser endossado pelo governo, ou partir de um pronunciamento oficial que ganha crescente proporção nas redes sociais.

Nós registramos queixas formais contra alguns oficiais do governo, incluindo aqueles envolvidos na maior força tarefa anti-insurgência. Mas a justiça trabalha devagar. Enquanto isso, eu pratico respiração profunda e tento ser precavida.

Oficiais negam possíveis “efeitos inibidores” desses ataques ininterruptos porque os filipinos em geral, e jornalistas em particular, continuam se expressando. Mas enfrentar corajosamente ataques ao nosso direito à liberdade de imprensa e livre expressão não é o mesmo que ter esses direitos respeitados pelo governo.

Dois anos atrás, a jornalista Patricia Evangelista, do Rappler, perguntou a um pequeno grupo de colegas o que seria suficiente para que nos calássemos.

“Nada”, foi a resposta de todos.

E então eu luto contra o medo todos os dias. Preciso fazer isso porque ficar em silêncio seria se render à tirania. Eu não vou deixar isso acontecer.

Inday Espina-Varona é uma premiada jornalista das Filipinas e editora contribuinte da ABS-CBN News e da agência de notícias católica LiCASNews. Ela já foi presidente da União Nacional de Jornalistas das Filipinas (NUJP, na sigla em inglês) e a primeira jornalista do país a receber o Prêmio para a Independência do Repórteres Sem Fronteiras (RSF).