Veto a secretário de segurança enfraquece Bolsonaro entre oficiais, mas não entre praças. Parlamentares da bancada da bala não acreditam em aventura golpista
Um discurso recorrente entre interlocutores do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no Palácio do Planalto é que sua verdadeira base de apoio na área de segurança estaria nas 27 Polícias e Bombeiros Militares dos Estados e Distrito Federal, e não nas Forças Armadas, da qual é o comandante em chefe. Dizem até que, se em uma hipotética e remota necessidade de intervenção para que Bolsonaro se mantivesse no poder, seriam parte dos 450.000 policiais que o apoiariam, e não os 345.000 militares de Exército, Aeronáutica e Marinha.
Depois de entrarem de cabeça na gestão federal, ocupando quase 3.000 cargos comissionados e nove ministérios, os representantes das três Forças temem cair no descrédito popular e têm buscado um distanciamento político do presidente. Esse descolamento está longe de ocorrer, já que boa parte dos que hoje possuem cargos de comando no Executivo são da ativa e ainda têm certa influência nos quarteis.
A aproximação do presidente de políticos representantes do Centrão, a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor de seu primogênito suspeito de rachadinha, e, principalmente, a não nomeação de um coronel da PM de Santa Catarina no Ministério da Justiça, resultaram em uma queda desse apoio entre o oficialato das polícias e dos bombeiros ao mandatário. Entre os praças (cabos, soldados e sargentos), no entanto, sua aprovação é quase unânime ao ponto de alguns jurarem lealdade ao presidente, mas não aos governadores dos Estados a quem estão diretamente subordinados.
Nas últimas semanas, a reportagem entrevistou representantes de sete associações estaduais de praças e oficiais PMs e bombeiros, dois parlamentares da bancada da bala – o senador Major Olímpio (PSL-SP) e o deputado federal Capitão Augusto (PL-SP) – e o presidente da Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais, coronel Marlon Teza. Os três últimos descartaram um levante contra os governadores em favor de Bolsonaro. Os outros sete, que falaram sob condição de não terem seus nomes publicados, não. Todos concordam, no entanto, que o presidente hoje não tem mais o apoio que teve desde 2018, quando se elegeu com forte discurso corporativista.
“Se eu precisasse ir para rua para manter Bolsonaro no poder eu e a maioria de meus colegas iríamos, sem dúvida. Mas esse apoio tem diminuído mês a mês por causa das ações do próprio Governo”, disse o dirigente de uma associação de praças da região Nordeste. A fala é similar à de um colega dele de uma entidade da região Sul. “Dizem que formaríamos milícias para sustentar o presidente ou para dar um golpe, mas não é isso. Nós só queremos manter a ordem e garantir que ele termine o seu mandato”, afirmou outro, em claro discurso golpista.
“Pode ser que individualmente ou alguns pequenos apoiem uma intervenção pró-Bolsonaro. O pensamento da cúpula e da maioria dos policiais e bombeiros é de obediência à legislação, de respeito à democracia. Não é um apoio cego ao presidente”, disse o coronel Marlon.
O principal ponto de inflexão nesse apoio ocorreu na semana passada, quando o ministro da Justiça e Segurança Pública, André Mendonça, convidou para a Secretaria Nacional de Segurança Pública o coronel Carlos Alberto Araújo Gomes, então comandante da PM de Santa Catarina e presidente do Conselho Nacional dos Comandantes Gerais das Polícias Militares e Corpo de Bombeiros. Gomes abandonou o comando da polícia e a entidade. Entrou para a reserva remunerada e, quando deveria ser empossado, viu seu nome ser rejeitado pela ala ideológica do governo Bolsonaro por conta de sua aproximação com o governador catarinense Carlos Moisés (PSL), um ex-aliado do presidente. Foi vetado para o cargo, que acabou sendo ocupado pelo coronel Carlos Paim, da PM do Distrito Federal. “Foi um mal-estar que poderia ter sido evitado. Ele era um nome eminentemente técnico”, disse o coronel Marlon.
A prisão de Queiroz e uma possível delação premiada que ele venha a fazer também pode causar baixa entre os apoiadores. “Como um policial vai defender alguém que é acusado de fazer esquema com dinheiro de gabinete de deputado? Se isso tudo se comprovar, cai por terra o discurso de combate à corrupção e junto vai a nossa esperança”, disse um dirigente da região Centro-Oeste.
Essa redução do apoio não é nova para quem vive o dia a dia do poder em Brasília. Para o ex-bolsonarista o senador Major Olímpio, o presidente tem se desgastado com os policiais desde a reforma da Previdência. “Entre os veteranos, ele ainda tem apoio porque suas decisões pouco o afetam. Quanto aos da ativa, não. Desde a reforma da Previdência ele tem decepcionado a classe que o elegeu”, disse.
Presidente da frente parlamentar da Segurança, a bancada da bala, o deputado Capitão Augusto, não há a possibilidade de um golpe do presidente, seja ele com apoio das Forças Armadas ou das PMs e bombeiros. “Quem diz que isso pode ocorrer é porque não conhece a lealdade das polícias à Constituição. Não creio em levante em hipótese nenhuma”, afirmou.
Se entre a sua base popular Bolsonaro pode estar perdendo apoio, na classe política, ele tem tentado se blindar para seguir no poder. Os principais acenos foram dados na aproximação com o Centrão com a cessão de dezenas de cargos e um ministério e na abertura do diálogo com o poder Legislativo, representada pelos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). Há poucas semanas era comum se deparar com um político agressivo, com discursos duros contra diversas frentes. Desde a prisão de Queiroz, contudo, as falas são mais comedidas. As polêmicas, por enquanto, não saem mais da boca presidencial. Ainda não está claro qual será o resultado dessa equação bolsonarista.
Fonte: El País
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