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segunda-feira, 24 de setembro de 2018

Bolsonaro não controla mais o bolsonarismo

O fenômeno virou metástase no interior do tecido social e não obedece ao comando do candidato
O fenômeno Jair Bolsonaro deixou de ser uma questão meramente política e eleitoral para se converter em um problema social e sociológico. O bolsonarismo se enraizou e entrou em metástase no interior do tecido social brasileiro.

Como se sabe, o eleitorado do capitão reformado é composto majoritariamente por homens, brancos, de classe média, com ensino superior e concentrado nas cidades grandes e médias e nas regiões de fronteira.
O fenômeno Jair Bolsonaro deixou de ser uma questão meramente política e eleitoral para se converter em um problema social e sociológico. O bolsonarismo se enraizou e entrou em metástase no interior do tecido social brasileiro.
Como se sabe, o eleitorado do capitão reformado é composto majoritariamente por homens, brancos, de classe média, com ensino superior e concentrado nas cidades grandes e médias e nas regiões de fronteira.
Evidentemente, sua presença é sentida em outros estratos sociais, mas com menor intensidade. O perfil eleitoral de seus apoiadores, entretanto, é apenas um pequeno aperitivo do que agrega sua base de sustentação social.
O bolsonarismo conformou uma nova aliança de classes no Brasil, uma espécie de exército zumbi hidrofóbico originário de “walkmin dead” e que congrega, no mercado, setores do rentismo, do grande comércio varejista, do pequeno e médio produtor rural e de profissionais liberais ligados ao velho bacharelismo.
No Congresso, parcela das bancadas do boi, da bala, da bíblia e dos nanicos que orbitam ao redor do “centrão”. No Estado, as baixas patentes da farda, da toga e do clero. Na sociedade, segmentos das igrejas neopentecostais, atletas de MMA/UFC, duplas e cantores sertanejos, apresentadores de programas de auditório, artistas e músicos ultrapassados, comediantes conservadores de stand up comedy e intelectuais de procedência duvidosa.
Uma parcela desse contingente heterogêneo, a extrema-direita que representa seu sumo, partilha de uma visão de mundo obscurantista e marcada por traços como o ódio, a intolerância, o machismo, o racismo, a lgbtfobia, a xenofobia. Muitas vezes são criacionistas, moralistas, terraplanistas e monarquistas, rechaçam os direitos humanos e louvam a violência e a tortura.
Não tem compromisso com a democracia ou com valores modernos. Substituem a noção de bem comum pela de ganhos privados. Sufocam o indivíduo moderno nas amarras da família tradicional e no lugar da igualdade de oportunidades retroagem em defesa da naturalização das desigualdades.
São liberais cínicos, proclamam como princípio a não-intervenção do Estado na economia com a mesma desfaçatez que o faziam aqueles que foram contra a abolição da escravidão e contra a instituição do salário mínimo no País.
O fenômeno não chega a ser propriamente inédito entre a fauna e a flora que compõe a cultura política brasileira. Chega mesmo a guardar alguma relação de parentesco com outras idiossincrasias nacionais como o udenismo, o janismo e até mesmo o malufismo, mas com novos componentes, claro, temperados pela presença da indústria cultural, das redes sociais digitais, do norte-americanismo, do militarismo civil e do fundamentalismo religioso.
A maior inovação talvez esteja no risco de instabilidade permanente em que essa aliança pelo regresso coloca o País, pois, dado esse perfil, o bolsonarismo talvez não seja controlável nem pelo próprio Bolsonaro, como observamos nos últimos dias.
Do ponto de vista econômico e político, Bolsonaro está circundado pelo investidor financeiro Paulo Guedes e pelo general de reserva Hamilton Mourão. O que deveria ser o lastro da moeda e das armas se mostrou, recentemente, um calcanhar de Aquiles.
Do hospital, Jair Bolsonaro precisou conter declarações ultraliberais e antipopulares de Guedes que davam notícia da criação de novos impostos e novas alíquotas regressivas incidindo sobre os trabalhadores e desonerando as altas elites.
E precisou barrar sanhas golpistas e reacionárias de Mourão em suas declarações preconceituosas sobre a “indolência” dos indíos, a “malandragem” dos negros, o “desajuste” das famílias monoparentais, a “mulambada” dos países emergentes, a possibilidade de “autogolpe” e a necessidade de uma Constituição que “prescinda do povo”.
O som de Guedes e a fúria de Mourão vieram acompanhados de atitudes incendiárias de apoiadores de Bolsonaro nas redes sociais.
As ofensas, ameaças e perseguições, reais e virtuais, contras as mulheres que organizaram o grupo e a campanha #EleNão é mais uma mostra de que a combinação de antipetismo, crise econômica, judicialização da política, instabilidade institucional e polarização ideológica criaram um ambiente de violência física, material e simbólica que não é mais governável nem mesmo por quem alimentou esse clima de conflagração e beligerância.
Como se sabe, o grau de rejeição e outras fragilidades tornam uma vitória eleitoral de Bolsonaro improvável, mas não se trata de algo impossível, e como a história mostra não convém subestimar as iras fascistas.
Desta forma, a se tomar como parâmetro o padrão de atuação das bases sociais, políticas e econômicas de Bolsonaro na campanha presidencial e a se imaginar hipoteticamente que o candidato vença, é muito provável que tenhamos ou um governo suficientemente forte, e autoritário, orientado para implementar um projeto que levará o País a um colapso social, ou um governo iminentemente fraco, e conservador, norteado pela sua própria auto-sobrevivência e que nos levará a mais um colapso institucional.
Nos dois casos teremos um cenário de mais crises e instabilidades. Se o fascismo vencer, o Brasil escreverá “uma história contada por um idiota, cheia de som e fúria”, pois Bolsonaro não controla o bolsonarismo.

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