O debate sobre a prostituição vem se tornando, nos últimos tempos,
terreno de disputas acirradas e mesmo violentas, fenômeno muito estimulado pelo
aumento do uso das plataformas sociais por trabalhadoras do sexo, grupo
historicamente marginalizado e deixado à parte do debate político.
De um lado, pessoas que defendem direitos para a categoria e lutam também contra o estigma.
De um lado, pessoas que defendem direitos para a categoria e lutam também contra o estigma.
De outro, grupos que acreditam na necessidade urgente de abolição da atividade
e que, para tal, atacam violentamente ativistas desse primeiro grupo, formado
em boa parte exatamente por pessoas que exercem o trabalho sexual, em suas
várias modalidades.Uma das principais estratégias usadas para deslegitimar as falas
das pessoas envolvidas em trabalho sexual e luta por direitos tem sido
justamente a de classificar essas pessoas como prostitutas de luxo.
Mas o que está por trás quando alguém usa como ofensa a expressão “prostituta de luxo”, quando usa essa qualificação falha e flutuante para dizer que determinadas trabalhadoras sexuais não devem ser ouvidas sobre o trabalho que exercem e o meio onde atuam por “não representarem a maioria”? Quem representaria essa maioria quando mesmo profissionais que atuam em nichos menos privilegiados, como os hotéis da Guaicurus e as ruas do Jardim Itatinga, têm as suas vozes silenciadas sob tal “acusação”? Remuneração adequada e melhores condições de trabalho não devem fazer parte das lutas da classe trabalhadora? E se devem, como sabemos que devem, por que é que não deveriam fazer parte das lutas das profissionais do sexo?
O problema real talvez seja exatamente o fato de uma trabalhadora sexual dita de luxo mostrar ao mundo que não é necessário viver de modo precário para exercer esta atividade, o que poderia ainda inspirar outras prostitutas a almejar uma vida de menos privações.
Mas, antes de tentar responder essas questões, é preciso entender o que significa ser uma puta de luxo, no imaginário dessas pessoas que nos atacam. O que temos percebido é que essa designação fala da mulher que tem acesso a tudo o que as outras mulheres têm, ou deveriam ter, mas conquistou essa posição exercendo a prostituição como modo principal de sustento. Poder fazer três refeições ao dia, ter um lugar pra morar, custear os próprios estudos, cuidar dos filhos, eis que de repente essas características tornam indignas as nossas palavras, as nossas lutas, mas não as de nenhuma outra classe de trabalhadoras. É como se prostitutas classificadas como “de luxo” tivessem já a vida ganha e não mais pudessem se organizar nem se pronunciar sobre a própria atividade que exercem. Essa classificação, como se vê, é antes de mais nada moral. Não importa como essa mulher chegou a tal posição ou de onde ela saiu: o que importa é que ela está ali, a mostrar que uma outra condição é possível para quem a sociedade quer que siga à margem, para quem o único lugar que essa sociedade reserva é o da violência.Ser enquadrada dessa forma por certa militância parece significar que não temos condições de falar senão de nós mesmas, talvez das prostitutas que trabalham nas mesmas condições, enquanto que nada impede essa militância, muitas das vezes formadas por mulheres da mesma classe social à qual nos “acusam” de pertencer, de querer falar por toda uma categoria à qual não pertencem, nunca pertenceram e nem cogitam fazê-lo um dia. Às vezes, parece mais fácil acreditar que a condição ideal para que se possa falar pelas prostitutas, defendê-las com propriedade, seja exatamente essa, ser classe média e nunca ter exercido a atividade – caso contrário, seu posicionamento com certeza será “viciado” e, pior, danoso para as que exercem a atividade de forma mais precarizada.
Mas o que está por trás quando alguém usa como ofensa a expressão “prostituta de luxo”, quando usa essa qualificação falha e flutuante para dizer que determinadas trabalhadoras sexuais não devem ser ouvidas sobre o trabalho que exercem e o meio onde atuam por “não representarem a maioria”? Quem representaria essa maioria quando mesmo profissionais que atuam em nichos menos privilegiados, como os hotéis da Guaicurus e as ruas do Jardim Itatinga, têm as suas vozes silenciadas sob tal “acusação”? Remuneração adequada e melhores condições de trabalho não devem fazer parte das lutas da classe trabalhadora? E se devem, como sabemos que devem, por que é que não deveriam fazer parte das lutas das profissionais do sexo?
O problema real talvez seja exatamente o fato de uma trabalhadora sexual dita de luxo mostrar ao mundo que não é necessário viver de modo precário para exercer esta atividade, o que poderia ainda inspirar outras prostitutas a almejar uma vida de menos privações.
Mas, antes de tentar responder essas questões, é preciso entender o que significa ser uma puta de luxo, no imaginário dessas pessoas que nos atacam. O que temos percebido é que essa designação fala da mulher que tem acesso a tudo o que as outras mulheres têm, ou deveriam ter, mas conquistou essa posição exercendo a prostituição como modo principal de sustento. Poder fazer três refeições ao dia, ter um lugar pra morar, custear os próprios estudos, cuidar dos filhos, eis que de repente essas características tornam indignas as nossas palavras, as nossas lutas, mas não as de nenhuma outra classe de trabalhadoras. É como se prostitutas classificadas como “de luxo” tivessem já a vida ganha e não mais pudessem se organizar nem se pronunciar sobre a própria atividade que exercem. Essa classificação, como se vê, é antes de mais nada moral. Não importa como essa mulher chegou a tal posição ou de onde ela saiu: o que importa é que ela está ali, a mostrar que uma outra condição é possível para quem a sociedade quer que siga à margem, para quem o único lugar que essa sociedade reserva é o da violência.Ser enquadrada dessa forma por certa militância parece significar que não temos condições de falar senão de nós mesmas, talvez das prostitutas que trabalham nas mesmas condições, enquanto que nada impede essa militância, muitas das vezes formadas por mulheres da mesma classe social à qual nos “acusam” de pertencer, de querer falar por toda uma categoria à qual não pertencem, nunca pertenceram e nem cogitam fazê-lo um dia. Às vezes, parece mais fácil acreditar que a condição ideal para que se possa falar pelas prostitutas, defendê-las com propriedade, seja exatamente essa, ser classe média e nunca ter exercido a atividade – caso contrário, seu posicionamento com certeza será “viciado” e, pior, danoso para as que exercem a atividade de forma mais precarizada.
“Não ouçam essas mulheres, não deixem que falem, que se organizem!”
E como se consegue isso? Acusando-as de ser prostitutas de luxo, desacreditando suas palavras, suas narrativas. Nisso já vamos vendo que, mais do que poder fazer três refeições ao dia, o que de fato nos classifica como prostitutas de luxo é acreditarmos que podemos falar por nós mesmas e que devemos ser protagonistas da luta que nos diz respeito. Se ela fala, se ela não se vitimiza, então só pode ser prostituta de luxo.
Essa postura se aproxima muito de um modo de proceder tipicamente machista, que acredita que mulheres que fazem sexo, que não tem vergonha de fazer muito sexo, e em especial as que cobram por isso, não podem falar por si. Postura frequente nos fóruns de avaliação de serviços sexuais, parece estar agora começando a ser aceita e defendida por alguns feminismos. Talvez haja uma questão de classe aqui: não por acaso estes homens pertencem à mesma classe social que aquelas que nos acusam de ser “prostitutas de luxo”
Fonte:Mídia Ninja
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