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terça-feira, 9 de fevereiro de 2016

A força dos temperos

Composto vegetal presente na salsa, no tomilho e na pimenta-malagueta estimula a produção de neurônios por parte das células-tronco humanas, aponta pesquisa brasileira. O tratamento com a substância também melhoraria a qualidade de conexões cerebrais.
Para reverter a perda de neurônios e de sinapses – transmissões de pulsos nervosos de uma célula para outra – decorrentes de doenças degenerativas e psiquiátricas, pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), da Universidade Federal da Bahia e do Instituto D’Or estão apostando em um composto vegetal chamado apigenina. Presente em alimentos como salsa, tomilho, pimenta-malagueta e camomila, a substância mostrou benefícios semelhantes aos do estrogênio, mas sem o seu potencial cancerígeno.
A apigenina pertence ao grupo dos flavonoides, compostos fenólicos presentes em plantas e algas cujo consumo apresenta benefícios diversos. “Flavonoides vêm sendo usados por séculos para promover a saúde cardiovascular e também para prevenir câncer. Na medicina chinesa, por exemplo, o consumo de chá e a ingestão pela alimentação eram usados para prevenção de doenças”, nota a veterinária Cleide Souza, do Departamento de Ciências Biomédicas da UFRJ. Motivada pelo histórico da utilização dos flavonoides para promoção da saúde, a cientista testou o efeito da apigenina em células-tronco.
“Flavonoides vêm sendo usados por séculos para promover a saúde cardiovascular e também para prevenir câncer"
Em 2010, Souza constatou o efeito do flavonoide agathisflavona – um biflavonoide formado pela união de duas moléculas de apigenina – na potencialização da produção de neurônios em culturas de células de camundongos. Agora, demonstrou que a apigenina foi capaz de induzir a diferenciação neural de células-tronco pluripotentes humanas, mais especificamente as células-tronco embrionárias e de pluripotência induzida (iPS), capazes de se diferenciar em qualquer tipo de célula do organismo. “Este trabalho foi diferente do que vimos com a agathisflavona nas células de camundongo. Mostramos que a apigenina por si só foi capaz de induzir a diferenciação neural nestas células”, detalha a pesquisadora.
No experimento, as células tratadas com apigenina se transformaram especificamente em neurônios, o que não aconteceria sem a presença da substância. Além disso, foi observado que neurônios já diferenciados a partir de células-tronco embrionárias também se beneficiaram com a apigenina, uma vez que o tratamento desses neurônios com apigenina resultou no aumento do número de sinapses, quando comparadas aos neurônios não tratados. Os resultados foram publicados em dezembro de 2015 na revista Advances in Regenerative Biology.

Substância promissora

O hormônio feminino estrogênio tem sido reconhecido por estimular o desenvolvimento e funcionamento do sistema nervoso, sendo também responsável pelo desenvolvimento e funcionamento das sinapses. Mas, embora seja um bom candidato para reverter a perda de neurônios e sinapses em doenças como Parkinson, Alzheimer, esquizofrenia e depressão, o uso do  estrogênio  é limitado por aumentar o risco de tumores. “Alguns tipos de câncer são dependentes de estrogênios, ou seja, uma terapia à base de estrogênio pode aumentar o risco de seu aparecimento”, explica Souza. Já a apigenina é uma molécula semelhante ao estrogênio em termos de função, pois é capaz de se ligar a receptores de estrogênio, mas não induz a formação de tumores – pelo contrário, estudos com células tumorais derivadas de cânceres de mama, pulmão e sistema nervoso indicam que tem ação anticancerígena.
A apigenina é uma molécula semelhante ao estrogênio em termos de função, pois é capaz de se ligar a receptores de estrogênio, mas não induz a formação de tumores
Até agora, os testes com apigenina foram realizados apenas in vitro, isto é, em culturas de células em laboratório. Por isso, ainda não foram identificados possíveis efeitos colaterais do tratamento com essa substância. Porém, antes de a apigenina se provar segura para um futuro uso farmacológico, é preciso realizar estudos in vivo e medir os possíveis riscos. O caminho é animador: “Estudos realizados por outros grupos em animais já demonstraram que o uso de apigenina via oral não apresentou nenhum efeito deletério”, conta Souza. 
Para o biólogo molecular Oswaldo Keith Okamoto, da Universidade de São Paulo, a pesquisa é promissora, pois sugere um novo caminho no tratamento de doenças neurodegenerativas e lesões no sistema nervoso, como acidentes vasculares cerebrais e lesões de medula. “O trabalho também sugere que a apigenina tem o potencial de melhorar a formação de sinapses neuronais, o que teria implicações em certas desordens psiquiátricas, como esquizofrenia, ansiedade e depressão”, comenta.

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