Internautas fazem vaquinha para agente de trânsito pagar indenização a juiz. “Estou ali para fazer cumprir a lei, então, vou fazer igual para todo mundo. É muito difícil, porque se eu não faço a multa, eu prevarico. Se eu faço, eu estou errada”, contou Luciana Tamburini
Internautas estão recolhendo ajuda financeira para que a agente de trânsito Luciana Tamburini, de 34 anos, possa pagar uma indenização de R$ 5 mil ao juiz João Carlos de Souza Correa, seguindo a determinação da Justiça do Rio de Janeiro. Pela instituição, Luciana foi condenada por abuso de poder e danos morais. Em 2011, ela abordou o magistrado em uma blitz, e verificou que ele estava sem carteira de motorista e dirigia um veículo sem placa e sem documentos.A advogada Flávia Penido, de São Paulo, criou uma vaquinha online para arrecadar o montante que será pago como indenização. Até as 18h desta terça (4), cerca de R$ 4 mil foram angariados. Luciana é servidora do Detran e recebe mensalmente R$ 3.700.
Flávia disse que ao tomar conhecimento da decisão judicial do desembargador José Carlos Paes, da a 14ª Câmara Cível do TJ-RJ, que manteve a condenação em segunda instância, publicada na última sexta-feira, ficou indignada e decidiu fazer a “vaquinha virtual” para ajudar a agente. “Eu acredito que é importante nesse momento o apoio da sociedade para a moça. Acho uma barbaridade o juiz se achar com todos esses poderes. É uma pressão importante. O juiz não pode julgar com base na pressão da sociedade, mas a sociedade deve mostrar que está atenta ao que eles estão julgando. Acredito que isso é mais importante do que o dinheiro”, disse.
No texto de apresentação da “vaquinha”, a advogada relata o que ocorreu e cita que a agente recebeu voz de prisão do juiz após dizer que “juiz não é deus”. No relato, ela diz que “esta decisão é um acinte a todos aqueles que defendem o direito de igualdade. Todo nosso apoio a Luciana”.
Após o episódio, Luciana passou a trabalhar internamente. “Estou ali para fazer cumprir a lei, então, vou fazer direito e igual para todo mundo. É muito difícil, porque se eu não faço a multa, eu prevarico. Se eu faço, eu estou errada”, contou ela.
Sentença
Cerca de três anos e meio depois de receber voz de prisão ao abordar um juiz em uma blitz da Lei Seca na Zona Sul do Rio, a agente da operação foi condenada a indenizar o magistrado por danos morais. Luciana Silva Tamburini processou o juiz João Carlos de Souza Correa, alegando ter sido vítima de situação vexatória. Porém, a Justiça entendeu que a vítima de ofensa foi o juiz e não a agente.
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Os internautas que se mobilizaram para apoiar Luciana Silva Tamburini, a agente da Operação Lei Seca condenada a pagar R$ 5 mil ao juiz João Carlos de Souza Correa, já arrecadaram mais de R$ 10 mil. A solidariedade surpreendeu a profissional, hoje licenciada da função.
— Nossa, eu achei muito legal. Se Deus quiser, vou reverter a decisão em terceira instância e vamos doar o valor arrecadado para alguma instituição. Essa solidariedade é o que importa. Estamos fazendo nosso trabalho. Saber que estão do nosso lado nos incentiva. O nosso governo só desincentiva. E a gente fica com medo de fazer o trabalho — comemora.
O processo que envolve Luciana e Correa teve início há três anos e meio, quando o juiz foi parado em uma blitz da Operação Lei Seca. Ele dirigia um Land Rover sem placa e documentação, não estava com a habilitação e deu voz de prisão a Luciana, quando ela disse que o magistrado “não era Deus”. Ela chegou a ser levada para a delegacia naquela noite.
Na última sexta-feira, entretanto, o desembargador José Carlos Paes, da 36ª Vara Cível do Rio, entendeu que foi ela quem “agiu com abuso de poder, ofendendo o réu, mesmo ciente da função pública desempenhada por ele”.
Revoltados com a multa, internautas de várias partes do país criaram uma vaquinha virtual para ajudar no pagamento, conforme havia adiantado a coluna de Ancelmo Gois.
Organizadora da mobilização, a advogada Flávia Penido ficou sabendo da decisão pelo Twitter.
— Não sou advogada criminalista, mas me chamou atenção o fato de a voz do juiz prevalecer, ainda que ele estivesse cometendo um ato ilícito. O magistrado estava sem habilitação, sem documento do carro e, mesmo assim, não se acabrunhou em dar voz de prisão à funcionária. Algumas pessoas já me disseram que ela não deveria ter dito que “juiz não era Deus”. E realmente talvez não devesse, talvez tenha lhe faltado tato. Mas falta de tato ainda não é crime. E o juiz estava cometendo um ato ilícito. Esse é um só dos muitos exemplos que nós vemos todo dia: aquela síndrome do “você sabe com quem está falando” — diz.
A vaquinha ficará no ar até terça-feira da semana que vem, quando a campanha "#juiznãoédeus" vai completar uma semana. Como foi arrecadado um valor superior ao da multa e do valor dos honorários advocatícios, o restante será doado como uma espécie de indenização.
— O TJ do Rio achou que Luciana não merecia uma indenização, mas nitidamente este não é o entendimento da sociedade. O remanescente que foi arrecadado será doado como uma indenização da sociedade à Luciana. Foi um pedido das pessoas que contribuíram e achamos correto — explica a advogada que organizou a campanha.
— O TJ do Rio achou que Luciana não merecia uma indenização, mas nitidamente este não é o entendimento da sociedade. O remanescente que foi arrecadado será doado como uma indenização da sociedade à Luciana. Foi um pedido das pessoas que contribuíram e achamos correto — explica a advogada que organizou a campanha.
De acordo com o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, o juiz João Carlos de Souza Correa não vai se manifestar sobre o caso. Este, porém, é apenas mais um capítulo de uma longa trajetória de confusões. Em 2007, quando ainda ocupava a 1ª Vara da Comarca de Búzios, o magistrado dera voz de prisão à jornalista e professora Elizabeth Peres da Silva Prata, presidente da ONG Ativa Búzios, por calúnia e difamação. O motivo foi a divulgação de uma carta aberta aos moradores do município da Região dos Lagos relatando supostas irregularidades praticadas por Correa — todas em questões fundiárias e imobiliárias.
Em 2010, o juiz foi alvo de uma investigação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por conta de uma série de decisões polêmicas, tomadas em processos sobre disputas fundiárias, também em Búzios. Contra ele, havia duas denúncias por conduta indevida — uma por supostamente favorecer um advogado que alega ser o dono de uma área de mais de cinco milhões de metros quadrados em Tucuns, uma das áreas mais nobres do balneário.
Segundo o CNJ, até o momento, os processos que envolvem o magistrado estão arquivados. Todos correram sob relatoria da Corregedoria Nacional de Justiça — e em sigilo. Correa está lotado hoje no 18º Juizado Especial Criminal de Campo Grande.
Fonte: G1 e Pragmatismo Político
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