Sem
receber componentes importados da China, fabricantes de eletrônicos reduzem
produção no Brasil. Agências de viagem lidam com preocupação dos clientes e
cancelamentos de viagens
A disseminação de
casos do novo coronavírus (Covid-19) pelo
mundo, inclusive no Brasil,
tem elevado a preocupação sobre os possíveis efeitos que a doença terá sobre a
economia global. Já se fala em uma redução do crescimento do mundo neste ano,
mas ainda é cedo para mensurar qual será o tamanho da queda. No caso do Brasil,
que tem como maior parceiro comercial a China ― epicentro da doença ― os
impactos não devem ser pequenos.
Em 2019, quase 30% das exportações brasileiras tiveram
como destino o país asiático, com destaque para a soja, o minério de ferro e o
petróleo. Diante da paralisia da economia chinesa neste início de ano, o quadro
deve, no entanto, mudar. Segundo José Augusto Castro, presidente da Associação
de Comércio Exterior do Brasil (AEB), ainda não há dados concretos para dar a
dimensão do problema atual. “O que já sabemos é que, infelizmente, teremos
queda na quantidade de exportação e nos preços das commodities,
como soja e minério. Para o Brasil é uma perda dupla”, explica.
A equipe econômica
do Governo de Jair Bolsonaro ainda avalia os efeitos do
coronavírus para uma eventual revisão nas projeções de crescimento neste ano,
segundo declaração do secretário do Tesouro, Mansueto Almeida. O secretário
avalia que o risco é tanto no preço de commodities quanto no
crescimento menor do mundo. “Se tivermos queda muito forte no crescimento mundial,
afeta todo mundo e, claro, o Brasil também”, afirmou Mansueto. Por ora, a
estimativa do Governo é que o PIB brasileiro crescerá 2,4% em 2020.
Fábricas reduzem produção
Além de ser um
relevante comprador, a China é um grande fornecedor de insumos da indústria
brasileira, especialmente a de eletroeletrônicos, que já sente os efeitos do
surto da doença. Fabricantes de celulares, como a Motorola, por exemplo,
tiveram que reduzir a produção de aparelhos devido a dificuldade de receber os
componentes importados do país asiático. Segundo o Sindicato dos Metalúrgicos
de Jaguariúna (SP), cerca de 80% dos funcionários da Flextronics, responsável
pela produção de celulares da Motorola, receberam um aviso de férias coletivas
de 15 dias que termina nesta sexta-feira. Sem perspectiva de mudanças no curto
prazo, a Flextronics prevê outro aviso de férias coletivas para parte dos
funcionários no período de 9 de março até o dia 28.
O cenário de falta
de componentes eletrônicos para abastecer os estoques da indústria brasileira
se agravou nas últimas semanas, conforme levantamento Associação Brasileira da
Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). De acordo com uma sondagem sobre o
impacto do coronavírus Covid-19 na produção, 57% das 50 indústrias
pesquisadas afirmaram enfrentar neste momento problemas no recebimento de
materiais, componentes e insumos provenientes do gigante asiático. Há duas
semanas, 52% disseram ter problemas.
As dificuldades do
setor concentram-se principalmente entre os fabricantes de produtos de
tecnologia da informação (celulares, computadores, entre outros). “O momento é
delicado e devemos ter diversas paralisações daqui para frente”, explica
Humberto Barbato, presidente executivo da entidade, em nota. A associação
afirma que 4% das indústrias pesquisadas registram algum tipo de paralisação
motivada pelos impactos do surto de Covid-19, e que 15% programam parar nos
próximos dias, de forma parcial.
Outro setor que já
sofre as consequências do avanço da doença pelo mundo é o do turismo. Agências
de viagens reconhecem que a disseminação da doença para países europeus, como o
caso da Itália, preocupa os brasileiros, que já se informam sobre a
possibilidade de cancelar passagens já compradas para a Europa. Nesta
quinta-feira, a Itália confirmou mais mortes pelo vírus, levando o número de
vítimas fatais no país para 17. São 528 casos confirmados, o maior número no
continente europeu.
O italiano Leonardo
Bonella, proprietário da Genus Europa Tour, explica que a busca por viagens
para a Itália, o décimo destino preferido dos brasileiros no ano passado, caiu
muito depois do aumento de casos da doença no país. Bonella ainda não teve que cancelar
nenhum pacote, mas já precisou acalmar alguns clientes sobre a situação da sua
terra natal. "Acho que como sou italiano, eles ficam um pouco mais
confiantes quando explico que apenas algumas regiões estão afetadas. É claro
que é necessário precaução, mas algumas notícias são alarmistas", diz.
Com muitas ofertas
de pacotes com destino para Ásia, Luiz Alvarenga, franqueado da Travelmate
Intercâmbio e Turismo em Belo Horizonte, avalia que as decisões dos clientes
têm variado. “Tenho uma cliente que fará um curso de três meses em Seúl, na Coreia do Sul, em abril, e ainda quer esperar o desenrolar
do caso do coronavírus. Já um grupo que sairia em março para um tour na
Ásia teve a viagem cancelada pela própria operadora. Mesmo que os locais não
fossem epicentro da doença, não vale a pena ficar com medo de passear na rua”,
explica.
Márcio Nakane,
gerente da agência de turismo Flaptur, reconhece que a preocupação tem rondado
os clientes, mas que os cancelamentos estão concentrados em viagens
corporativas. “Os próprios eventos e cursos estão sendo cancelados”, diz. O
Procon-SP orienta os consumidores que compraram passagens para países em que
casos da doença foram comprovados, a procurarem o órgão se optarem por cancelar
a viagem em razão da preocupação com o coronavírus. “Isso porque, nessa
hipótese específica, que não tem previsão legal, faz-se necessário negociar com
a empresa que não pode se recusar a oferecer alternativas ao consumidor”,
explica a nota do Procon-SP.
Fonte: El País
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