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segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

'Eles me estupraram e postaram o vídeo do crime em um site pornô' Parte 1

No ano passado, Rose Kalemba escreveu post contando o quanto tinha sido difícil remover um vídeo do estupro que sofreu aos 14 anos de um site popular de compartilhamento de pornografia. Dezenas de pessoas entraram em contato com ela para dizer que enfrentavam o mesmo problema.

Mas, logo, centenas de milhares de pessoas veriam o estupro por si mesmas — e desses espectadores ela não recebeu simpatia.

Uma década depois, Rose Kalemba penteia o cabelo preto grosso diante do espelho do banheiro, girando as pontas com os dedos para formar cachos naturais. Não podia fazer isso nos meses após o ataque. Todos os espelhos de sua casa tinham que ser cobertos com cobertores, ela não suportava ver seu reflexo
Essa é sua história:
A enfermeira parou na porta que dava para o quarto de hospital de Rose e virou-se para encará-la.


"Sinto muito que isso tenha acontecido com você", disse ela, com a voz trêmula. "Minha filha também foi estuprada."

Rose olhou para a enfermeira. Ela não devia ter mais de 40 anos, pensou.
Ela lembrou da manhã seguinte ao ataque, das conversas com o policial sem emoção e o médico. Todos usaram a frase "alegado" ao se referirem ao violento ataque de uma hora que Rose lhes havia descrito. Com exceção de seu pai e avó, a maioria de seus parentes também não acreditava nela.

Com a enfermeira foi diferente. "Ela acreditou em mim", diz Rose.
Era um pouquinho de esperança — alguém reconhecendo o que havia acontecido com ela. Uma onda de alívio tomou conta dela, parecia ser o começo de sua recuperação.

Mas, logo, centenas de milhares de pessoas veriam o estupro por si mesmas — e desses espectadores ela não recebeu simpatia.
Uma década depois, Rose Kalemba penteia o cabelo preto grosso diante do espelho do banheiro, girando as pontas com os dedos para formar cachos naturais. Não podia fazer isso nos meses após o ataque. Todos os espelhos de sua casa tinham que ser cobertos com cobertores, ela não suportava ver seu reflexo.

Ela agora tem 25 anos e organizou uma rotina de autocuidado em sua vida diária.
Cuidar do cabelo faz parte disso. Pentear leva tempo e esforço, é quase um ato de meditação. Ela sabe que tem cabelos bonitos, as pessoas comentam sobre isso o tempo todo. Todas as manhãs, ela também toma uma xícara de um tipo puro de cacau, que ela acredita ter qualidades curativas, e faz uma lista de suas metas em um diário.
Ela deliberadamente os coloca no tempo presente.

"Eu sou uma excelente motorista", é uma meta. "Estou feliz casada com Robert", é outro. "Eu sou uma ótima mãe."

Sentando-se para conversar, Rose puxa o cabelo por cima dos ombros. Ele cobre a maior parte do corpo, como uma armadura.

Na pequena cidade em Ohio onde cresceu, não era incomum que Rose saísse para passear sozinha antes de dormir. Ela relaxava, apreciava o ar fresco e a paz. Até aquela noite do verão de 2009, quando tinha 14 anos.

Um homem apareceu, de repente, das sombras. Ameaçando-a com uma faca, ele a forçou a entrar em um carro. Sentado no banco do passageiro estava um segundo homem, de cerca de 19 anos — ela já o havia visto pela cidade. Eles a levaram a uma casa do outro lado da cidade e a estupraram por um período de 12 horas, enquanto um terceiro homem filmou partes do ataque.

Rose estava em choque — ela mal conseguia respirar. Ela foi severamente espancada e esfaqueada na perna esquerda, e ficou com as roupas ensanguentadas. Ela perdia e recobrava a consciência.

Em algum momento, um dos homens pegou um laptop e mostrou a ela vídeos de ataques a outras mulheres. "Eu sou nativo-americana", diz ela. "Os estupradores eram brancos e a estrutura de poder estava clara. Algumas das vítimas eram brancas, mas muitas eram mulheres de cor."

Mais tarde, os homens ameaçaram matá-la. Forçando-se a recuperar os sentidos, Rose começou a conversar com eles. Se eles a libertassem, ela não revelaria suas identidades, disse ela. Nada jamais lhes aconteceria, ninguém saberia.

Os homens a largaram em uma rua a cerca de meia hora a pé de sua casa.
Entrando pela porta, ela viu seu reflexo no espelho do corredor. Escorria sangue de um corte em sua cabeça.

Seu pai, Ron, e alguns outros membros da família estavam na sala de estar prestes a almoçar. Ainda sangrando por sua facada, ela explicou o que havia acontecido com ela.
"Meu pai ligou para a polícia, ele imediatamente me confortou, mas os outros disseram que eu estava 'pedindo', saindo tarde da noite daquele jeito", diz Rose.

Na sala de emergência, Rose foi recebida por um médico e um policial.
"Os dois lidaram comigo de uma maneira distante", acrescenta ela, "não houve gentileza nem compaixão."

O policial perguntou a ela se o ataque havia começado de maneira consensual, se tinha sido uma "noite selvagem".

Rose ficou atordoada. "Fui espancada, sangrei", pensou.
Rose disse que não, não tinha sido consensual. E ainda se recuperando do que passara, disse que não sabia quem a atacara. A polícia não tinha pistas para continuar.

Continua...

 Clique aqui e veja as Parte 2 e Parte 3.

Fonte: BBC Brasil

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