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segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

'Eles me estupraram e postaram o vídeo do crime em um site pornô' Parte 2

Alguns meses depois, Rose estava navegando no MySpace quando viu que várias pessoas de sua escola estavam compartilhando um link. Ela tinha sido marcada. Clicando nele, Rose foi direcionada para o site de compartilhamento de pornografia Pornhub. Ela sentiu uma onda de náusea ao ver vários vídeos do ataque que sofreu.
Quando Rose foi liberada no dia seguinte, ela tentou se suicidar, incapaz de imaginar como poderia viver uma vida normal agora. O irmão dela a impediu a tempo.


Alguns meses depois, Rose estava navegando no MySpace quando viu que várias pessoas de sua escola estavam compartilhando um link. Ela tinha sido marcada. Clicando nele, Rose foi direcionada para o site de compartilhamento de pornografia Pornhub. Ela sentiu uma onda de náusea ao ver vários vídeos do ataque que sofreu.

"Os títulos dos vídeos eram 'adolescente chorando e levando tapas', 'adolescente sendo destruída', 'adolescente desmaiada'. Um tinha mais de 400 mil visualizações", relata Rose.

"Os piores vídeos foram aqueles em que eu desmaiei. Me ver sendo atacada quando eu nem estava consciente foi a pior coisa."

Ela tomou a decisão de não contar à família sobre os vídeos — a maioria dos parentes não tinha demonstrado apoio de qualquer maneira. Dizer a eles não levaria a nada.

Em poucos dias, ficou evidente que a maioria de seus colegas na escola havia visto os vídeos.
"Eu fui bullied", diz ela, "as pessoas diziam que 'eu pedi'. Que estimulei os homens. Que era uma vagabunda."

Algumas crianças disseram que seus pais haviam dito para ficar longe dela, caso ela os seduzisse e depois os acusasse de estupro.

"As pessoas têm mais facilidade de culpar a vítima", diz ela.

Rose diz que enviou vários e-mail para o Pornhub durante um período de seis meses em 2009 para pedir que os vídeos fossem retirados.

"Argumentei com eles. Escrevi: 'Por favor, sou menor de idade, isso foi estupro, por favor, preste atenção'."

Ela não recebeu resposta e os vídeos permaneceram na página.

"No ano seguinte, me fechei totalmente", lembra ela, "não sentia nada. Fiquei insensível, quieta."
Toda vez que um estranho fazia contato visual com ela, ela se perguntava se eles haviam visto os vídeos.
"Eles gostaram? Eles sentiram prazer com o meu estupro?"

Ela não suportava se ver. Por isso cobriu todos os espelhos da casa com cobertores. Ela escovava os dentes e tomava banho no escuro, pensando o tempo todo sobre quem poderia estar assistindo os vídeos.

Então, ela teve uma ideia.
Ela configurou um novo endereço de e-mail fingindo ser advogada e enviou ao Pornhub uma ameaça de ação legal.

"Em 48 horas, os vídeos desapareceram."

Meses depois, Rose começou a fazer tratamento psicológico, e finalmente revelou a identidade de seus agressores ao psicólogo, que tinha o dever de denunciá-los à polícia. Mas ela não contou à família ou à polícia sobre os vídeos.

A polícia coletou declarações de Rose e sua família. Os advogados dos agressores argumentaram que Rose havia consentido em fazer sexo e os homens foram acusados não de estupro, mas "contribuir para a delinquência de um menor" — um crime menor — e receberam uma suspensão condicional de sentença.

Rose e sua família não tinham energia nem recursos para lutar por uma sentença mais dura.
Ron Kalemba pensa muito sobre o que aconteceu com sua filha. O que ele poderia ter feito de diferente, se soubesse mais, ele se pergunta. A filha dele mudou depois do ataque. Ela deixou de ser uma boa aluna e passou a matar aulas e não entregar a lição de casa.

Estamos sentados em um parque perto de sua casa. Ele e Rose às vezes leem trechos da Bíblia juntos, sentados em um banco de piquenique. Eles não falam muito sobre o passado.
"Parece que o mundo inteiro a decepcionou", diz ele. "O estupro dela foi como uma grande piada para os outros. Isso mudou sua vida completamente, as pessoas a decepcionaram a cada passo do caminho."

Ron só ouviu falar dos vídeos do Pornhub em 2019, quando Rose escreveu sua história num blog e ela se tornou viral nas mídias sociais. Ele não tinha ideia de que o estupro de sua filha havia sido visto por tantas pessoas, nem que as pessoas da escola dela a haviam ridicularizado por isso.

"Me lembrei de uma garota que conheci quando estava na escola, na oitava série", conta Ron. "As pessoas a sacaneavam, ela apanhava. E nenhum de nós dizia nada, apenas assistíamos."

"Encontrei ela anos mais tarde e ela disse que achava que eu também era um bully, porque eu ficava parado assistindo. Na realidade, apenas algumas pessoas a machucaram, mas ela achava que estávamos todos contra ela, porque assistíamos e não dizíamos nada."

É isso que ele acha que aconteceu com Rose?

"Sim, mas foi pior para ela. Ela também teve que lidar com uma multidão digital de agressores. Alguns silenciosos e outros abusivos. O dela é diferente."

Pai

Nos anos seguintes, Rose mergulhou no mundo digital.

Ela passou a se dedicar a escrever, se expressando em blogs e mídias sociais, às vezes usando pseudônimos, às vezes usando seu nome verdadeiro.

Em 2019, começou a ver no seu feed de mídia social várias postagens sobre o Pornhub. As pessoas elogiavam a empresa por doar para ONGs de preservação de abelhas, por colocar legendas para espectadores surdos, por ajudar instituições de caridade ligadas à violência doméstica e por fornecer bolsas de US$ 25 mil ( RS$ 106 mil) para mulheres que desejam ingressar na indústria de tecnologia.
Segundo o Pornhub, seu site recebeu 42 bilhões de visitas em 2019 — um aumento de 8,5 bilhões em relação ao ano anterior, com uma média diária de cerca de 115 milhões, e 1,2 mil pesquisas por segundo.

"É impossível evitar o Pornhub se você usa as mídias sociais", diz Rose. "Eles fizeram um ótimo trabalho em posar como 'esclarecidos', mas vídeos como o meu ainda estão no site. Não há como saber se há estupros por lá e as vítimas não sabem."

Na postagem do blog que se tornou viral, Rose compartilhou um relato detalhado de seu estupro e criticou o Pornhub por fechar os olhos até que ela fingisse ser advogada. Dezenas de mulheres e alguns homens responderam ao seu post, dizendo que vídeos que mostravam abuso sexual também apareceram para eles no site.

Continua...

Leia aqui as Parte 1 e Parte 3.

Fonte: BBC Brasil

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