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quarta-feira, 11 de setembro de 2019

Machismo e censura contra empreendedoras que aplicam a tecnologia ao sexo

Algumas ativistas denunciam critérios diferentes para avaliar projetos do segmento ‘sextech’, que movimenta 30 bilhões de dólares por ano, em função de estarem voltados para um público masculino ou feminino
“Adorei falar de sexo com você, e praticamos quando você quiser.” Após escutar esta resposta à apresentação de seu projeto, Andrea Oliver não se intimidou. Longe disso. Pôs no seu devido lugar o investidor que soltou essas palavras e continuou procurando financiamento para lançar o Emjoy, um aplicativo que, mediante sessões de áudio, promete melhorar o bem-estar sexual das mulheres, o que o enquadra no segmento sextech. Composto por aparelhos e serviços que aplicam a tecnologia à vida sexual, esse mercado movimenta 30 bilhões dólares (123 bilhões de reais) por ano e cresce a um ritmo anual de 30%, segundo Tristan Pollock, sócio da aceleradora 500 startups.
“Adorei falar de sexo com você, e praticamos quando você quiser.” Após escutar esta resposta à apresentação de seu projeto, Andrea Oliver não se intimidou. Longe disso. Pôs no seu devido lugar o investidor que soltou essas palavras e continuou procurando financiamento para lançar o Emjoy, um aplicativo que, mediante sessões de áudio, promete melhorar o bem-estar sexual das mulheres, o que o enquadra no segmento sextech. Composto por aparelhos e serviços que aplicam a tecnologia à vida sexual, esse mercado movimenta 30 bilhões dólares (123 bilhões de reais) por ano e cresce a um ritmo anual de 30%, segundo Tristan Pollock, sócio da aceleradora 500 startups.


“Eu sabia que seria difícil para mim, porque era uma jovem de 27 anos tentando levantar capital na Espanha para uma companhia de sextech orientada exclusivamente para mulheres e centrada no mercado anglo-saxão, mas fui em frente porque minha ideia estava respaldada por estudos científicos e sexólogos”, recorda a empreendedora.

Após aquele episódio, as coisas melhoraram, até que ela arrecadou o necessário para formar uma equipe e lançar o aplicativo, em julho passado. Nesse mesmo mês, a empresa de capital de risco Nauta Capital, onde Andrea Oliver trabalhou durante dois anos, anunciou um investimento de um milhão de euros (4,53 milhões de reais) no Emjoy.

Prova superada? Não totalmente. Ainda faltava derrubar a barreira da censura. “Um dia depois de fazermos os primeiros anúncios no Facebook, nossa conta foi fechada. De repente. Tivemos que falar com a rede social para explicar que não havia nada de pornográfico no nosso aplicativo, porque nos centramos no âmbito da saúde, e a educação sexual é uma peça fundamental do bem-estar geral, mas para fazer publicidade sem problemas finalmente optamos por mensagens mais sutis no Facebook”, conta Oliver.

Ativismo contra os critérios ambíguos

Mas as propostas relacionadas ao bem-estar sexual masculino são tratadas do mesmo jeito? Algumas vozes afirmam que a censura no setor sextech é mais permissiva quando a publicidade se dirige a homens. Para demonstrá-lo, as empresas Dame e Unbound lançaram recentemente o jogo Approved, Not Approved, que desafia o usuário a adivinhar quais anúncios foram permitidos ou recusados nas redes sociais, revistas impressas e no metrô de Nova York. “Com esta campanha queremos que o público compreenda que as pautas publicitárias se aplicam de maneira seletiva nas plataformas sociais, o que limita o acesso às soluções e à educação sexual que algumas marcas oferecem”, comenta ao EL PAÍS Polly Rodriguez, CEO e cofundadora da Unbound e que, junto com Lidia Bonilla, criou em 2015 a Women of Sex Tech, uma comunidade que reúne mais de cem empreendedoras com projetos tecnológicos sobre bem-estar sexual.

Segundo Rodriguez, existe um padrão que tende a considerar o prazer como parte da saúde sexual dos homens, enquanto que no caso das mulheres o prazer se separa da saúde sexual. “Há anúncios relacionados com a disfunção erétil ou aumento do pênis porque são associados à saúde, enquanto que os lubrificantes, os vibradores e outros acessórios são catalogados como produtos para o vício e têm a publicidade proibida no Facebook, Instagram, Pinterest, Snapchat, Twitter, AdRoll e no metrô”, diz.

A experiência de Patricia López, CEO e fundadora da Myhixel, de certo modo rebate esse duplo critério ligado ao gênero. O projeto dessa empreendedora espanhola de 35 anos se centra em melhorar o bem-estar sexual masculino com uma solução para controlar a ejaculação. Para isso, combina-se um dispositivo masturbador, que vibra e se aquece até entre 36,5oC e 37oC, com um programa de exercícios feito a partir de um aplicativo. 
“Fomos banidos do Facebook, Instagram, YouTube… Nem sequer podemos nos divulgar no Tinder ou em portais de encontros, por isso, pelo menos no nosso caso, não existe uma maior permissividade por nos dirigirmos a homens”, comenta López. Qual é então a linha vermelha? Para a CEO da Myhixel, a censura no sextech não tem a ver com produtos masculinos ou femininos, e sim com a presença de um aparelho físico ou brinquedo sexual, mesmo que desenvolvido para tratar disfunções como a ejaculação precoce. “Nosso masturbador está sendo certificado como dispositivo sanitário na UE, temos uma metodologia para o controle ejaculatório baseada em estudos científicos e colaboramos com o Instituto Sexológico Murciano, a Universidade Miguel Hernández de Elche e o Hospital Virgen del Alcázar de Lorca. Achávamos que não teríamos problemas, mas a Apple, por exemplo, não lançou o nosso aplicativo enquanto não centramos a explicação na terapia, desvinculando-a do aparelho”, afirma López.

Feiras com polêmica

Cada vez são mais frequentes as feiras de sextech onde dispositivos tecnológicos para o bem-estar sexual são expostos sem problemas. Mas até agora a apresentação desses produtos tecnológicos era reservada a eventos sobre brinquedos sexuais ou a feiras tecnológicas. Este último caso também deu lugar a polêmicas em torno do gênero dos usuários, como a ocorrida na última edição da popular CS de Las Vegas, em janeiro passado, quando o vibrador para mulheres Osé foi excluído da zona de exposição por não se encaixar em nenhuma categoria permitida, apesar de, na convocação inicial da feira, ter ganhado o prêmio de inovação no quesito Robótica e Drones. Após queixas de Lora Haddock, fundadora e CEO do fabricante do aparelho, que recordou a presença na CS de produtos destinados ao público masculino, como bonecas sexuais ou pornô em realidade virtual, os organizadores do encontro recuaram, em maio passado, e devolveram o prêmio ao dispositivo, embora sua presença na CS 2020 ainda não esteja confirmada.

ELAS DOMINAM

Dos 36 expositores confirmados para a próxima edição da Sx Tech de Berlim, uma feira centrada em sextech, 22 são mulheres, e muitas delas com projetos centrados no público feminino. "Tradicionalmente, o homem foi mais liberado, enquanto a sociedade ditou muitas normas à mulher. Entretanto, uma nova geração de jovens, que crescemos em uma realidade mais aberta, estamos empreendendo no âmbito da sexualidade e com produtos orientados ao público feminino porque não gostamos do que encontramos até agora", diz Andrea Oliver, da Emjoy. Neste sentido, Polly Rodriguez, da Unbound e Women of Sex Tech, recorda que muitos brinquedos eróticos para a mulher centraram seu desenho em formas fálicas, quando deveria ter sido dada mais importância às respostas biológicas do corpo humano. "Para chegar ao orgasmo, 70% das possuidoras de lábios vaginais necessitam de estimulação do clitóris, algo que raramente ocorre só com a penetração. Já houve muitos vibradores desenhados sem levar em conta os comentários de quem os usava, mas agora sabemos que tanto a vibração como a sucção e a estimulação geral do clitóris são fundamentais na hora de criar esses aparelhos", salienta Rodriguez.

Fonte: El País 

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