Poucos estudos históricos sobre a adolescência permitem uma definição diferente da do dicionário de Antônio Houaiss a época: “processo de amadurecimento, jovem”.
Nessa fase, passava-se de criança a adulto, sem considerações específicas, como querem alguns pesquisadores? Não. Tudo indica que houvesse marcos. E a descoberta da sexualidade era um deles. Se os pais, aparentemente, estavam concentrados em duas questões para seus filhos adolescentes, como o casamento e a profissão, o mesmo não se pode dizer dos próprios jovens que desvendavam como podiam, as transformações de seus próprios corpos. (…)
O historiador Paulo Sérgio do Carmo sublinha que ao ser educada em moldes tradicionais, a juventude seguia acreditando, como seus avós, que o corpo era algo impuro, devendo na medida do possível ser ocultado, pela vestimenta e mesmo negado. Além disso, eram tidas como “inferiores”, “vergonhosas”, “baixas” e “sujas” as partes corporais vinculadas à sexualidade.
Segundo tais normas morais, explica do Carmo, os órgãos genitais não deviam ser tocados ou contemplados. Se possível, eles deveriam se comportar como se o sexo não fizesse parte de sua vida. Acreditava-se que o despertar da sexualidade masculina merecia um tratamento diferenciado daquele reservado às mulheres. Contra o ideal de castidade das moças, a iniciação sexual precoce valorizava os rapazes. Tal como no passado, a admissão de doenças venéreas, quase obrigatória, era valorizada como prova de virilidade. A mentalidade machista e patriarcal da sociedade os incentivava a todos os excessos enquanto, as moças não podiam ter qualquer liberdade.
Essa era a tese: uma sociedade repressiva onde as moças não ousavam. Não ousavam por que rapidamente eram colocadas de lado, com a pecha de “perdidas”. Como bem dizia Nelson Rodrigues, “Eu poderia fazer, aqui, todo um capítulo sobre o pudor. O comportamento do homem e da mulher até princípios de 1919 era medieval, feudal ou que outro nome tenha. Psicologicamente, ainda não ocorrera para nós a abertura dos portos. A mulher que ia ao ginecologista sentia-se, ela própria, uma adúltera”. Muitas, porém, ultrapassavam as barreiras. Deixavam-se tocar, eram curiosas. (…)
Apesar das restrições e tabus, a juventude banhava em sexo. Da consequente excitação em observar os animais, passava-se a praticar sexo com eles. O coito com animais estava disseminado, sobretudo, nas áreas rurais onde, segundo do Carmo, sobrava pouco tempo para os devaneios que levavam à masturbação. E, sem preconceitos, por favor. Afinal, a zoofilia foi praticada por séculos em todas as partes do mundo. Confirmado por estudos do crítico literário Antonio Cândido até meados do século XX, o coito com animais abusava das criações domésticas mais acessíveis – cabras, porcas, galinhas. Mas, vacas, também, como contou José Lins do Rego, confirmando a prática de “encostar no barranco”:
“Sabiam demais os primos de Santo Antônio. Sabiam tanto que não havia segredo para eles. E tanto não havia que andavam pelo cercado em libertinagem com as vacas (…)”. Mas se a parte teórica do aprendizado sexual passava pela masturbação e a zoofilia, a parte prática era adquirida nas zonas de meretrício.
Apesar dos experimentos vividos às escondidas, a repressão era forte e a ênfase no pudor, uma obsessão. E havia quem fosse contra ou a favor. “A nossa educação está errada. Todo o domínio sexual está envolto em um mistério que não é natural, entre véus de excessivo pudor”, dizia um manual intitulado Leitura Reservada, em 1913. Já congressos e trabalhos científicos sobre a importância dos anos “púberes” multiplicavam-se, preocupados em impor à família “uma reação doméstica coletiva, no sentido de combater o despudor”.
Fonte: História Hoje
Imagem: trecho de O Jardim das Delícias Terrenas, de Hieronymus Bosch
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