-Porra Fred!
-Vai Paulinho!
-Vai nessa bola, caralho!
-Divide essa com raça!
E assim fiquei indignado com aquela pelada. Porra, velho! A
seleção brasileira que tem cinco copas do mundo marcado em seu escudo, fazer
uma cagada dessas?
É muito foda de imaginar isso. Mas se fizermos uma analise
dos jogos dessa copa podemos perceber que não era para ser tão diferente assim.
A Alemanha vez uma copa com muito mais qualidade tática, coisa que o Brasil não
apresentou e na verdade nunca teve. O problema vai muito além dos jogadores brasileiros e comissão técnica que ali estavam.
Os brasileiros, em sua essência, tem sempre um jeitinho para
driblar os problemas. A palavra drible é umas das mais usadas do nosso
vocabulário. Precisamos driblar o transporte lotado, o salário insuficiente e
todos os problemas que aparecem no dia-a-dia, que não são poucos. Nossa
tendência é sempre ter um jeito para continuar na árdua vida que levamos. Essa
malandragem, veio dessa necessidade de subsistência num país em que, apesar dos
avanços, ainda, poucos tem muito e
muitos tem pouco. Agente anda na periferia e vê muita gente talentosa, vendendo
papelão, verdura, espremedor de fruta, panela, consertando fogão e o escambau.
Esse é o povo desse país. Um povo que muitas vezes transforma esse jeitinho em
talento, percebido agora pelo mundo todo nesta copa. E dessa forma, formula-se
o pensamento do verdadeiro jogador de futebol brasileiro. Veja que quando você joga ou
assiste uma pelada, é fato: os moleques querem pegar a bola e foda-se para o
mundo. É para frente que a pelota rola. E não me venha com esse negócio de
esquema tático. Esquema tático é para pernas-de-pau(eu mesmo sou o mais
clássico deles). Esse jeitinho, bem talhado, vira talento. Mas você deve está
se perguntando: Se temos essa malandragem e esse talento, por que o futebol
brasileiro está nessa maré? Não é difícil entender. Primeiro precisamos entender
o contexto em que se encontra o ambiente político, a Copa e o futebol
brasileiro. Como todos já estão carecas de saber, a Copa do Mundo, quando
pleiteada pelo país, era unanimidade entre quase todas as forças políticas. Mas no contexto
político atual, a Copa passou a ser um campo importantíssimo de disputa
ideológica, ponto estratégico para a campanha da direita, desejando arduamente o
seu fracasso. Um grande numero de equívocos foram criados para desqualificar a
competição. Mas é muito complicado fazer isso quando você tem por outro lado, o
povo apoiando. As falácias da direita sobre a questão dos investimentos para a
Copa( a velha confusão entre investimento e financiamento e outras cositas
más que são muitas para citar agora), foram por terra. Quando a própria
direita percebe o envolvimento do povo e o legado que o evento deixaria, todos
passaram a amar a Copa. Político que queria acabar com o futebol, fez selfie em
estádio durante os jogos. Então percebemos que o ambiente de disputa absorveu a Copa
como a tentativa de ataque ao governo e embate eleitoral. Isso é sem duvida um
fator muito importante. Mostra que a pressão para boas atuações não ficaria só
no área do esporte e sim da disputa política nacional.
Agora para completar a trilogia do “vexame”, vamos falar do
futebol no Brasil. Como falei, o brasileiro é talentoso. Mas por que o país dos
jogadores talentosos está em decadência? Neste ponto precisamos falar da
estruturação do futebol brasileiro. A começar pela CBF. Quem lembra dos
escândalos que se meteram João Havelange a qual teve que deixar o Comitê
Olimpico Internacional e Ricardo Teixeira a CBF com envolvimento com um cartola
catalão? ( Veja: http://esportes.estadao.com.br/noticias/futebol,escandalo-que-derrubou-havelange-e-teixeira-contou-com-redes-de-rosell,1085928 )Outros fatos importantes: os tapetões. Quantas piadas já saíram com o
Fluminense, que é mais fácil o Sol cair que o Fluminense? Esse esquema
estrutural do futebol nacional é extremamente nocivo ao espetáculo e ao desenvolvimento
do esporte. Você assistir ao campeonato com um monte de gente dizendo a mesma
besteira que se ouvia na Copa como a “Copa Comprada”, você ouve o tempo todo nos
campeonatos regionais e o nacional por causa desses famigerados tapetões. Outro
ponto importante é a arbitragem. Apontemos a Máfia do Apito que foi um
esquema que envolveu árbitros de futebol e golpistas de sites de aposta durante
o Campeonato Brasileiro de 2005. Com os resultados acertados com o juiz, a
quadrilha lucrava em apostas milionárias em sites de jogatina na internet. É o mais
bizarro e vergonhoso episódio futebol brasileiro e um escândalo de repercussão
internacional. Gravações telefônicas revelaram que Edilson Pereira de Carvalho,
em conluio com os empresários, “vendeu” e, em outras oportunidades, tentou
“vender” os resultados de muitas das 25 partidas que apitou desde janeiro de
2005.(Veja: http://veja.abril.com.br/blog/acervo-digital/futebol/futebol-relembre-os-maiores-escandalos-do-mundo-da-bola/ ) Além destes infelizes fatos sobre a arbitragem,a formação
insatisfatória e não profissionalização também é um grande
problema. Um arbitro da FIFA ganha pouco mais de R$20 mil para o evento mas quantos
jogadores estrelas de times pequenos ou que
joga em times medianos ganham este valor? Temos boas escolas para arbitragem? Qual a dificuldade estrutural que um arbitro no Brasil enfrenta para
desempenhar sua profissão? Ele pode viver apenas com esses ganhos? Apesar dessa
estrutura ser extremamente prejudicial para o nosso esporte, tem o que acho o
mais degradante: a elitização da profissionalização do futebol.
Hoje o futebol é pouquíssimo esporte e quase totalmente
ascensão sócio-economica. Não se pretende mais fazer medicina, engenharia,
direito e ter sucesso nessas carreiras, mas ser um jogador de futebol. Ser
jogador, mesmo que medíocre quer dizer status. É a forma mais imponente de se
colocar na sociedade e obter bens. Ser um bem sucedido capitalista. Não que eu
condene quem quer ganhar a vida de forma honesta no esporte ou que todos os
jogadores milionários tem concepções atrasadas, lembrando do Ramirez e David
Luiz fazendo o “L” homenageando Lula, mas imagine o tempo de Sócrates? Garrincha? Um
jogadorzinho que me parece chamar Tostão? Tostão que foi a mais cara transação,
chegando a R$2,5 milhões no ano de 1972 quando vez nada mais que 248 gols pelo
Cruzeiro. Não condeno os ganhos ou o glamour mas se você elitiza, onde entrará
o talento? E quem tem mais estrutura financeira poderá mais? Imagine que um “simples
muleque” como o Neymar tem os holofotes do mundo inteiro direcionado a ele? Como seria bom acordar com um monte de jornalista querendo saber o que ou quem eu comi
hoje? Hoje vemos que existe uma linha de produção de
craques. Eles são “cidadãos comuns” que são trabalhados para serem
profissionais dentro de campo. Lembram do Ronaldo Fenômeno? Este mesmo coxinha
que fala asneiras na Globo, que era magrelo e fantástico com a bola no pé,
precisou ser moldado na linha de montagem do futebol e seu joelho não suportou?
Quantos moleques existem pelos campinhos de favelas que não
tem uma chance? O talento é típico do povo mas pelo simples fato do país do futebol
burocratizar e elitizar a prática do futebol profissional, muitos garotos não
tem uma oportunidade. Quantas vezes você ouviu pela televisão que aquele
jogador é filho do jogador tal ou foi indicado pelo jogador tal? Será que nosso
futebol de várzea e de favela, o verdadeiro futebol talentoso é representado
por estes atuais jogadores que aí estão? Por que o país do futebol que poderia
vomitar vários Neymar’s, hoje só tem um?
Enquanto os clubes brasileiros não abrirem realmente as
portas para os verdadeiros jogadores, teremos um futebol medíocre e elitista em
sua estrutura. Um profissão que está cada vez mais fechada aos artistas da bola
e mais aberta aos oportunistas. Cada vez que assistimos um jogo, torcemos para
que nosso time não seja roubado e que na primeira substituição apareça um
favelado endiabrado que gosta de bola para encher nossos olhos.
Mas mesmo com todos esses contras e a derrota pavorosa da
nossa seleção, eu sou brasileiro e digo sim ao nosso futebol. Dilma, mesmo que
existam imbecis para te vaiar, nos tem para te agradecer pelo belíssimo
espetáculo que nos proporcionou esta Copa. A Copa das Copas. Dos brasileiros,
dos argentinos, colombianos, costa-riquinhos, hondurenhos, chilenos, mexicanos.
A Copa de toda América. Aquele que não
teve dinheiro para ir aos jogos, como eu e meus amigos também te agradecem e
sabemos que nosso povo sofrido ganhou a Copa, o PROUNI, o Minha Casa Minha
Vida, o PNE e muitos outros avanços conquistados e outros que, sem sobra de dúvidas, conquistaremos. Se com um
futebol limitado não ganhamos dentro de campo, com raça e vontade estamos ganhando
fora dele.
Romney Mesquita
Sindicalista, Ativista Digital, Blogueiro e ex- lateral esquerdo perna de pau do Independente F.C. e Ipiranga F. C. de Moema
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