MPF já solicitou documentos e informações relativos à morte de Herzog às Comissões Nacional e Estadual da Verdade e a diversos órgãos
O Ministério Público Federal em São
Paulo instaurou um novo inquérito para investigar a responsabilidade criminal
de agentes da ditadura militar no assassinato do jornalista Vladimir Herzog,
preso e torturado em 1975.
A procuradora responsável, Ana Letícia Absy, já solicitou documentos e informações relativos à morte de Herzog às Comissões Nacional e Estadual da Verdade e a diversos órgãos, entre eles, os Arquivos Nacional e do Estado de São Paulo.
A procuradora responsável, Ana Letícia Absy, já solicitou documentos e informações relativos à morte de Herzog às Comissões Nacional e Estadual da Verdade e a diversos órgãos, entre eles, os Arquivos Nacional e do Estado de São Paulo.
O inquérito foi instaurado na última
sexta-feira, 3 de agosto, mas os primeiros ofícios com pedidos de informação
estão sendo expedidos nesta segunda-feira pelo Ministério Público, que informou
ainda que fontes bibliográficas também serão utilizadas ao longo da
investigação, entre elas o livro A Casa da Vovó, do jornalista Marcelo Godoy.
A reabertura das investigações
tiveram como base as determinações da Corte Interamericana de Direitos Humanos
(CIDH), que condenou o Estado brasileiro pela
falta de investigação, julgamento e punição dos envolvidos no
assassinato de Herzog. Na sentença proferida em março deste ano, a CIDH
destacou que o episódio configura um crime contra a humanidade e que a Lei da
Anistia não pode ser aplicada como razão para o Estado deixar de investigá-lo.
Apesar de avaliação do Supremo Tribunal Federal reconhecendo em 2010 a
constitucionalidade da Lei da Anistia, ela não pode ser usada em casos que se
enquadram em crime contra a humanidade.
Na sentença proferida em março, a CIDH destacou que o episódio configura
um crime contra a humanidade e que a Lei da Anistia não pode ser aplicada como
razão para o Estado deixar de investigá-lo
“A tortura e morte de Vladimir Herzog
não foram um acidente, mas a consequência de uma máquina de repressão
extremamente organizada e estruturada para agir dessa forma e eliminar
fisicamente qualquer oposição democrática ou partidária ao regime ditatorial,
utilizando-se de práticas e técnicas documentadas, aprovadas e monitoradas
detalhadamente por altos comandos do Exército e do Poder Executivo”, diz a CIDH
na sentença.
A Corte concluiu ainda que “são
inadmissíveis as disposições de anistia, as disposições de prescrição e o
estabelecimento de excludentes de responsabilidade que pretendam impedir a
investigação e punição dos responsáveis por graves violações dos direitos
humanos, como a tortura, as execuções sumárias, extrajudiciais ou arbitrárias e
os desaparecimentos forçados”.
O Brasil já foi condenado
anteriormente pela Corte devido à omissão em casos referentes a crimes durante
a ditadura. Em 2010, a CIDH proferiu sentença contra o país pela falta de
investigação e julgamento dos responsáveis pela morte de militantes que atuaram
na chamada Guerrilha do Araguaia.
No ano seguinte, o MPF informou que
adota em sua atuação “o entendimento da Corte quanto à imprescritibilidade e à
impossibilidade de anistia para assassinatos e desaparecimentos de opositores
ao regime militar”. Os delitos, destacou a Procuradoria-Geral da República em
manifestação de 2011, foram cometidos “em contexto de ataque sistemático e
generalizado do Estado brasileiro contra a população civil, o que permite
classificá-los como crimes de lesa-humanidade”.
Das 36 ações que o MPF ajuizou nos últimos anos em todo o país contra
agentes da repressão envolvidos em assassinatos de civis, somente duas estão em
andamento em varas e tribunais federais
Vladimir Herzog morreu em 25 de
outubro de 1975, no mesmo dia em que se apresentou voluntariamente ao
Destacamento de Operações de Informações (DOI) em São Paulo para prestar
depoimento. Após sofrer tortura nas dependências da unidade, os agentes da
ditadura militar forjaram suicídio – versão endossada pelo Exército – simulando
um enforcamento ao envolver uma tira de pano em seu pescoço e amarrá-la a uma
grade com cerca de 1,6 metro de altura.
Três anos depois, uma ação movida por
familiares de Herzog fez com que a Justiça Federal reconhecesse a falsidade do
laudo necroscópico e atribuísse o crime à União. Mais tarde, o Estado
brasileiro admitiu sua responsabilidade, por meio de publicações da Comissão
Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (2007) e da Comissão Nacional da
Verdade (2014). Em 2013, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinou
que as lesões e os maus-tratos sofridos durante o interrogatório constassem da
certidão de óbito de Herzog.
No campo criminal, no entanto, não
houve sucesso nas tentativas recentes de identificação dos assassinos. O MPF
ressaltou que “casos como o de Herzog ainda enfrentam resistências no
Judiciário, que tem evocado não só a Lei da Anistia como também a suposta
prescrição para barrar processos relativos a crimes da ditadura”.
Das 36 ações que o MPF ajuizou nos
últimos anos em todo o país contra agentes da repressão envolvidos em
assassinatos de civis, somente duas estão em andamento em varas e tribunais
federais. O MPF afirmou que as dificuldades se estendem também à consulta a
dados oficiais do regime militar. “O MPF já buscou, por exemplo, informações
sobre os servidores que atuavam no DOI, mas não conseguiu acesso aos arquivos
do governo federal referentes ao período”, divulgou o órgão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário