“Atravessa as avenidas Brasil e do Contorno, servindo de limite à região da Savassi, avançando em direção à Serra do Curral. Termina na Praça da Bandeira, bairro Mangabeiras, onde intercepta a avenida Bandeirantes.
Com grande variedade arquitetônica, é marcada por estilos de diferentes épocas. Ao longo de seu percurso, encontram-se vários pontos históricos e culturais importantes, além de igrejas de diversos cultos e órgãos dos poderes públicos municipal, estadual e federal.
Com grande variedade arquitetônica, é marcada por estilos de diferentes épocas. Ao longo de seu percurso, encontram-se vários pontos históricos e culturais importantes, além de igrejas de diversos cultos e órgãos dos poderes públicos municipal, estadual e federal.
Destacam-se o prédio da Prefeitura, o Cine-Teatro Brasil, a Igreja São José, o Parque Municipal, o Teatro Francisco Nunes, o Automóvel Clube, o Palácio da Justiça Rodrigues Caldas, o Conservatório da UFMG, o Palácio das Artes, o Edifício Acaiaca, o Othon Palace Hotel, o Café Nice, o Centro Cultural do Instituto Moreira Salles e a Bolsa de Valores Minas-Espírito Santo-Bahia. Aos domingos, abriga a Feira de Artes e Artesanato”.
Assim a avenida Afonso Pena, uma das principais vias da região central, é descrita no site da prefeitura municipal de Belo Horizonte. A descrição estaria perfeita e completa se não fosse o fato de que o local é também um dos principais cenários da prostituição de mulheres e travestis na capital Começa a partir da rua Alagoas com Afonso Pena até altura da rua Alfena nas proximidades do Tribunal de Justiça de Minas, no bairro Serra.
É ali que mulheres como a paulista R., 32 anos, estudante de psicologia, que está prestes a concluir o curso, completa o seu dia de trabalho. Ela diz ter ficado o dia todo em um hotel da Guaicurus, onde afirma ter feito 38 programas com valor médio de R$ 40. Recém chegada a BH, fazia programas na rua Augusta em São Paulo e também em boates daquela cidade. “Me falaram super bem de BH e eu acabei vindo para cá ludibriada. Lá em SP a situação está ruim, mas aqui não está muito diferente. Achei que ia ganhar mais”, comenta.
Garota de programa há 15 anos, ela começou na prostituição aos 17. ” Lá em São Paulo falam que BH tem o shopping do sexo. Um local onde você fica como se fosse numa vitrine, onde os caras podem te escolher, sem você precisar fazer muito esforço, sem precisar investir tempo como nas boates de São Paulo, quando você tem que beber, seduzir e acaba sendo algo mais demorado e que muitas vezes acaba não rendendo. Aqui parece uma vitrine mais não é bem isso “, comenta ela enquanto segura uma lata de cerveja e acena para os carros que passam na via.
Ao contrário do hotel, na rua ela cobra entre R$ 70 e R$ 100 por um oral no carro, o que pode durar em torno de 20 minutos. No motel o programa completo varia entre R$ 150 a R$ 200, sem anal – o que traria uma taxa extra -, mas tudo com preservativo, afirma. Quando perguntada qual a diferença de estar entre quatro paredes e na rua, ela não titubeia. “No quarto você tem mais contato com a pessoa, observa mais, tem mais controle da situação. Já na rua você olha para a pessoa e ao entrar no carro, você conta com a sorte. A gente na verdade nunca sabe o que pode acontecer”, diz.
Assim como a prostituta, para ela, o cliente também está numa posição frágil quando busca o sexo na rua, permitindo que uma pessoa estranha entre no carro. É neste clima de contar com a sorte que se estabelece um jogo de negociação em busca do prazer, que mistura medo e desejo entre consumidores e prestadoras de serviços sexuais na avenida Afonso Pena.
A dinâmica na rua parece não ter segredo. Quando o cliente chega seja de carro ou de moto, a garota se aproxima. Oferece seus serviços, fala sua idade quando perguntada, o valor diante do pedido do cliente. Dependendo do combinado, seguem para uma das ruas escuras ou com pouca iluminação nos arredores da própria avenida. No carro pode rolar uma penetração rápida ou só um oral. Anal não é aconselhado por elas. Os que preferem algo mais demorado seguem para um motel próximo ao Detran da avenida João Pinheiro ou na avenida Brasil, quando não para a BR 040, onde estão alguns motéis de luxo na saída para o Rio de Janeiro.
Em meio a nossa conversa com a paulista, uma mulher de meia idade que aqui vamos chamar de Ruiva interrompe o bate-papo ao gritos. Ela diz para a R. “que puta não pode dar entrevista, pois puta não é artista. Quem você acha que é?, indaga. Visivelmente nervosa, ela pega R pelo braço a escrachando em via pública e exige que a reportagem saia do local. Entre os dentes, R. diz que a mulher é a cafetina do quarteirão e implora, pedindo pede pelo amor de Deus que a reportagem saia do local para não aumentar ainda mais a confusão. Em questão de segundos, várias meninas se aglomeram xingando palavras de baixo calão e exigindo a saída da reportagem.
Com a ajuda de um comerciante que tem um estabelecimento na área e conhecia o intuito da reportagem, a tal cafetina e as demais meninas se acalmam. Entende que não estamos ali como espiões ou mesmo para denunciá-las. “Nós não gostamos de entrevistas. Já aconteceu de caras chegarem aqui e gravar a mulher pra expor no YouTube. Tem sempre um vagabundo querendo nos humilhar”, explica Ruiva, pedindo desculpas pela maneira grosseira como surgiu.
Ruiva, 43 anos, é quem que cuida das meninas do quarteirão. Nascida na região metropolitana de BH, atualmente mora na Zona Leste da capital. Há 15 anos, depois de andar por vários locais da cidade e região, além de outros municípios do interior e inclusive de outros estados do Brasil, é na Afonso Pena que ela trabalha em dias de céu estrelado ou em dias de chuva, fazendo calor ou frio. Em dias de chuvas, as marquises dos prédios servem de abrigo a quem não pode deixa de trabalhar.
Ruiva começou na prostituição aos 14 anos dquando fugiu de casa após ter sido abusada pelo padrasto . “Eu cheguei a contar para minha mãe, mas ela não acreditou no meu relato. Então, saí de casa com a roupa do corpo. Sem um centavo no bolso. Me vi sozinha no mundo. Não tinha o que comer e onde dormir. Meu primeiro programa foi por um prato de comida. Tive nojo de mim, mas a vida sempre segue adiante. Com este primeiro homem acabei morando por um tempo. Tive um casal de filho”, revela. Hoje a filha dela de 22 é sua maior companheira na Afonso Pena. ” Eu não queria que ela estivesse nessa vida, mas quando descobri ela já estava. Ela começou também aos 14 anos como eu “. Segundo ela a descoberta veio por um “um instinto materno”, após ser alertada por uma travesti.
” Eu me lembro que uma vez em um local onde eu estava trabalhando uma travesti me disse que tinha visto uma garota na Afonso Pena muito parecida com minha filha. Eu fiquei encucada com aquilo por dias, quando resolvi averiguar. Peguei um táxi e passei por aqui quando a vi. Ela apanhou uma, duas, três vezes. Mas não teve jeito. Foi algo que escorreu pela minhas mãos. Então, perguntei a ela se era isso mesmo que ela queria e a resposta está ai hoje”, relembra ela com a voz embargada afirmando que a filha foi criada pelo pai, após a separação.
Aos 22, a filha de Ruiva, tem um corpo exuberante, visivelmente excitada pelo álcool que bebe enquanto espera clientes, ela conta que começou a vida sexual aos 13 anos. Na época ouviu atrás da porta, a mãe conversar com uma vizinha sobre o trabalho na Afonso Pena. ” Depois de ouvir aquilo, eu fiquei curiosa. Um dia estava indo para um baile, e resolvi mudar o caminho. Subi a avenida e nunca mais desci. Minha mãe até que tentou, mas não teve jeito. Hoje ela me dá dicas. Cuidamos uma da outra aqui”, diz.
Fora da avenida ou quando estão em casa, o assunto não é abordado destacam ” Meu filho de 16 anos não sabe de nada. Quando souber não sei como será a reação dele. Sou muito afetuosa com ele, mas ele é sistemático. Vamos ver como será”, revela a mãe.
À filha, ela dá conselhos ajudando a ter feeling apurado nas ruas com os clientes. Os conselhos vão desde a necessidade do uso da camisinha a consciência diária de que essa realidade um dia vai passar. ” Eu já tive a idade dela. A gente acha que é imortal. Que a beleza da gente não passa, mas passa. Por isso eu falo para ela sempre guardar um dinheiro, investir em um local para ela morar. Ter cuidado com as outras putas, porque tem muitas mafiosas por aqui. Peço que tenha cuidado com as drogas, porque aqui na rua e neste mundo ela faz parte da nossa rotina. Muitas vezes acaba sendo nossa ajuda imediata para dar conta, para não pensar demais na vida, para fugir das angústias.Também aconselho a ter cuidado com os clientes. Eu sei como é a maldade humana e sei o que eles podem fazer. Sempre digo para ela que se for para arrumar um homem que seja como a belíssima loira esposa do presidente – referindo-se a Marcela Temer, esposa de Michel Temer – , para você tirar dele e não ele tomar de você”, detalha.
Para ela, mesmo dividindo a pista com a filha, o senso protetor de mãe fala alto. ” Eu não tive uma mãe para cuidar de mim. Eu não tive família. Eu quis construir a minha. E meus dois filhos são minhas maiores riquezas”, completa ela, definindo-se como um bicho louco na proteção os filhos. Na rua quando a filha entra no carro, a placa é anotada. Se o programa é nas redondezas, uma “voltinha” nas proximidades do carro é indispensável.
A vida é mais real que o filme da Bruna Surfistinha
Geralmente as mulheres chegam a avenida por volta das 20h. Algumas desembarcam no local logo que o sol se põe. É possível vê-las pelos pontos de ônibus, andando pela região de onde só saem por volta das 4h, 5 horas da manhã. Segundo muitas delas, sair antes é raro. Cada uma para vencer a noite costuma colocar uma meta variando entre R$ 200 a R$ 400 por noite. Cada noite é imprevisível. Assim muitas vão para a avenida nos dias próximos ao pagamento ou nos dias de vale dos clientes para conseguir faturar.
Na avenida, as garotas estão por toda uma extensão de 3Km, que vai logo depois das esquinas da rua Alagoas com Afonso Pena, até altura da esquina da rua Alfena com Afonso Pena. Ao longo deste trajeto, os pontos de ônibus são utilizados como descanso para esperar o cliente que passa. Corpos com roupas insinuantes estão encostados em carros estacionados ao longo da via. Com muitas árvores, e uma iluminação não tão boa, elas se camuflam entre a paisagem. Muitas aproveitam as condições para fazer uso de maconha, cocaína, crack entre um programa e outro. ” É difícil levar a noite na cara limpa. Muitas vezes você chega aqui com a cabeça cheia de problemas e você ainda tem que fingir ter tesão, fazer homem gozar. A droga acaba sendo este suporte”, afirma S, 29 anos, sentada em ponto de ônibus próximo ao batalhão do Corpo de Bombeiros, da rua Maranhão. Na pequena bolsa, ela carrega uma garrafinha com vodka, entre itens da maquiagem e muitas camisinhas.
“ Muita gente acha que vida de puta é fácil. Mas não é não. A gente tem uma vida normal . A gente caga, mija, cozinha, lava, passa, tem problemas do mesmo jeito. Quando chega aqui tem que sorrir mesmo que não tenhamos vontade pro maior babaca do mundo, que se acha o tal porque está ali sentado no conforto do carro. Todo mundo acha que a gente dorme o dia todo e a história não é assim. A gente sai daqui com o dia clareando e quando chega em casa tem uma vida para cuidar”, comenta D. natural da Bahia, 28 anos.
“Você acha que a vida da gente é como o filme da Bruna Surfistinha ? Ali tem muita verdade, mas nem de longe a realidade mostrada é como ela é de fato”, afirma ela referindo-se a produção de 2005, baseado na vida de Raquel Pacheco, garota de programa paulistana.
O que eles procuram
Com 15 anos de Afonso Pena, 7 anos trabalhando em hotéis da Guaicurus, 5 anos em boates, em quase 30 anos de prostituição, Ruiva conta que se for colocar todos os homens com quem já transou, inclusive penetrando os caras, em fila indiana indo da Praça da Bandeira até a Praça da Rodoviária, o que em quilometros equivale a 4,4 KM, ela dará voltas.
Da Guaicurus, onde trabalhou 7 anos, hoje diz achar nojento transar com um homem por R$ 20 e ainda ter que pagar diária ao hotel. ” Os donos de hotel não tem dó. Lá você dando ou não você tem que pagar a diária”, fala revoltada.
Na rua assim como nos hotel ou nas boate tem todo tipo de pessoa em busca de sexo. Os clientes buscam o que a intimidade com a mulher, esposa, namorada não permite pedir. “São tanto fetiches e taras que ficaríamos aqui falando horas sobre isso”, revela.
“Certa vez eu vim para cá e sai com um cara. No dia eu usava um vestido que esticava. O cara estava acima do peso. Algo em torno de 140 Kg. Ele pediu para vestir meu vestido, minha calcinha, passei batom nele e ele0 calçou meu salto. Só faltou a peruca”, relembra Ruiva, que calça 39, e sempre trabalhou no mesmo ponto entre Av. Getúlio Vargas e rua Piauí e hoje pensa em contar sua história em um livro com o título, Minha vida na prostituição.
O vício em crack
Mesmo sem contato com os irmãos que moram na RMBH, Ruiva que mora na região leste da capital, ainda tem receio de um dia ser vista por eles na Afonso Pena. “Quando tem jogo do Cruzeiro tenho medo do meu irmão passar aqui. Não temos muito contato, mas sempre fico de olho se um deles passar de carro. Então, fico atenta”. Para a familia, mesmo sem relação estreita com eles, ela justifica o dinheiro como vindo de serviços de faxina. “As vezes vou lá , onde tenho uma amiga fazendo faxina e tiro uma foto minha fazendo a faxina só para não desconfiarem e posto nas redes sociais”, conta ela como faz para despistar os familiares.
Com uma família desestruturada, ela buscou nas drogas o alivio para as adversidades da vida e para a falta de apoio familiar. “Eu sai de casa com a roupa do corpo. Casei com um homem sem gostar somente para sobreviver. Eu cheguei a usar crack, quase morri, mas por pura determinação eu conseguir me livrar. Mas o passado na cabeça ainda é vivo e pesa”, desabafa ela com a voz embargada ao relatar os motivos que a levou ao crack. ” Consegui vencer por amor aos meus filhos. Tive fé. Frequentei os tóxicomaníacos por um tempo e hoje estou limpa. Aqui na rua me sinto deprimida, mesmo rodeada de pessoas. Sempre quando bate uma tristeza tomo meu anti-depressivo”,completa.
O que rola nos carros
No carro a transa rapidinha é chamada por elas de “sacho”, também denominado por elas de “equê”, a mentira. Na maioria das vezes o homem chega aqui já muito louco, drogado, com tesão a mil e quando goza não costuma gasta mais que 5 minutos. Você faz seu trabalho rápido e já libera o moço. Além desse clientes, há os clientes que curtem um programa combo. ” Eles pegam a gente aqui e depois uma boneca do outro lado. Neste esquema ele consegue entrar no motel sem chamar a atenção”, comentam.
Se você acha que as mulheres que ficam quase nuas são as que mais faturam, engana-se. Cada uma na rua tem seu “axé”, na linguagem delas significa a roupa que a garota veste. “Muitos homens até gostam da mulher mais pelada, mas muitos preferem ela vestida, mas discreta, preferem imaginar o que tem por baixo”, revelam.
Fonte: BHAZ
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