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segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Secretário de Saúde de governador tucano elogia o Mais Médicos; programa alivia orçamento de cidades pobres do Pará

Dario de Negreiros*, de Belém, especial para o Viomundo
O secretário de Saúde Pública do Pará, Hélio Franco, afirmou que a vinda de 63 médicos formados no exterior será “importantíssima” para o estado. A declaração foi feita durante a chegada dos profissionais do programa Mais Médicos, do governo federal, na Base Aérea de Belém, no último sábado.
“É uma ajuda importantíssima para a atenção básica no Pará”, disse. “São médicos que vão ficar permanentemente no município, o que é fundamental. E eles possuem experiência na atenção primária. O grande problema nosso não é a média e a alta complexidade. Estas só vivem lotadas porque a atenção primária não tem funcionado adequadamente.”
Questionado sobre os elogios feitos a um programa que é uma das maiores bandeiras do governo federal petista, o secretário da gestão de Simão Jatene, do PSDB, disse não ver problemas nas declarações. “Quem for sério e estiver preocupado com saúde não pode envolver questões político-partidárias nisso.”
Os médicos que chegaram a Belém, em sua maioria cubanos, desembarcaram em um estado que ostenta alguns dos piores índices de desenvolvimento humano do Brasil. No ranking do IDHM (Índice de Desenvolvimento Humano Municipal) de 2013, o Pará é o antepenúltimo colocado, à frente apenas de Maranhão e Alagoas.
Em uma análise mais fina, percebe-se que a situação a ser enfrentada por esses médicos é ainda muito pior do que a vivida pelo paraense médio. Se um Estado fosse, a capital Belém teria o 6º melhor IDHM do Brasil, empatada com o Rio Grande do Sul. Ocorre que apenas 10% dos paraenses acumulam metade da renda de todo o Estado, enquanto a população de muitos municípios do interior convive com índices de desenvolvimento similares aos de países como Malawi e Sudão, na África.
Arquipélago do Marajó
É o caso de muitas das cidades que compõem o arquipélago do Marajó, o maior arquipélago flúvio-marítimo do mundo, localizado na foz do rio Amazonas. Para lá, devem ser enviados 24 médicos cubanos o que, segundo o secretário de Saúde Hélio Franco, significa dobrar o número de médicos da região, que conta hoje com cerca de 470 mil habitantes.
“Pra manter um médico no interior do Pará, paga-se de R$19 mil a R$ 25 mil, para trabalhar três vezes por semana”, conta Newton Pereira, secretário da Saúde da cidade de Soure. “Pra mantermos três médicos, então, custaria quase R$ 100 mil.” A arrecadação mensal do município, entretanto, é, segundo Pereira, de R$ 40 mil. “O prefeito ganha R$ 7,5 mil. E o secretário ganha R$1.710”, conta.
Soure deveria ter recebido uma médica brasileira pelo programa Mais Médicos, mas ela não compareceu. “Ela fez todos os procedimentos, mas não apareceu. Estou atrás dela”, diz Pereira. Dos 1.096 brasileiros selecionados na primeira fase do programa, menos da metade se apresentou.
“Eles ganham mais do que um juiz do STF (Supremo Tribunal Federal)”, diz Pedro Barbosa, vice-presidente da Amam (Associação dos Municípios do Arquipélago do Marajó), segundo quem os salários chegam a R$ 30 mil, R$ 2 mil a mais do que recebem os magistrados do supremo. Os valores, diz Barbosa, atrapalham outras ações sociais urgentes. “A gente tem um lençol muito pequeno; se cobre a cabeça, não cobre o pé.”
Nesta primeira fase do programa, o Pará distribuirá 56 médicos formados no exterior por 27 municípios, além de outros seis profissionais que trabalharão em dois DSEIs (Distrito Sanitário Especial Indígena). Atualmente, os 6 mil médicos em atividade no Pará conferem ao Estado a baixíssima média de 0,7 médico por mil habitantes, menos da metade da já baixa média brasileira (1,8 por mil).
Para piorar, apenas 27% dos médicos que atuam no Pará trabalham fora das regiões metropolitanas. Países como Itália, Alemanha, Portugal, Espanha e Uruguai têm entre 3,5 e 4 médicos por mil habitantes.
Vaiado em Fortaleza, o médico Alain Mora recebeu cumprimentos e uma flor ao desembarcar em Belém. Depois, posou para fotos.

Alain Mora, um dos médicos cubanos que foram vaiados durante protesto organizado no dia 27 de agosto pelo Simec (Sindicato de Médicos do Ceará), qualificou o ato ocorrido em Fortaleza de “vergonhoso”.
Mora, que é formado pela Faculdade de Medicina de Guantánamo, em Cuba, diz que ele e seus colegas ficaram muito surpresos com a ação. “Nós não tivemos medo porque fomos realmente surpreendidos.” Eles estavam em Fortaleza participando do curso organizado pelo Ministério da Saúde para os selecionados pelo programa Mais Médicos.
“De repente, vimos uma confusão. Pensávamos que estavam nos apoiando e, quando saímos, nos disseram: ‘Não, estão gritando contra vocês, chamando-os de escravos’”, conta. “Foi um ato vergonhoso. Se somos escravos, somos escravos da saúde, da solidariedade. E isso porque acreditamos que um mundo melhor é possível”, disse.
Na tarde deste sábado, 63 médicos formados no exterior chegaram à Belém. A partir do dia 23, deverão iniciar seus trabalhos em 27 cidades e dois DSEIs (Distrito Sanitário Especial Indígena), no Pará. Mora, entretanto, apenas fazia escala na Base Aérea de Belém. Ele irá trabalhar no município de São Paulo de Olivença, no Amazonas. “Nós não estamos competindo, estamos indo justamente onde eles não querem trabalhar.”
A reação de Wilben Mancebo Bueno, que irá clinicar na cidade de Rurópolis, na região de Tapajós, no Pará, também foi de surpresa. “Não sei por que nos chamaram de escravos. Nós não somos escravos. Somos médicos, assim como eles. Se eu não quisesse vir, teria ficado em meu país”, garante. E repete, com ares de perplexidade: “Não sei por que nos chamam de escravos. Não sei.”
Além de médico, Bueno é professor da Universidade de Santiago de Cuba. Sobre a formação dos médicos cubanos, o professor destaca a relação de proximidade que eles procuram estabelecer com os pacientes. “Nós temos uma formação de aproximadamente seis anos e, além disso, desde o segundo ano trabalhamos junto à comunidade”, afirma. “Conhecemos os principais problemas de saúde da comunidade desde o início da carreira.”
É este mesmo modelo de relação médico-paciente que Bueno espera trazer ao Brasil. “Se eu tenho um mensagem para a população que eu vou atender, é que ela se sinta, com a gente, como em família, como entre amigos”, diz. “Nós não estamos aqui por dinheiro, mas por solidariedade. O povo de vocês também é nosso povo.”
O médico brasileiro Rogério de Amorim Oliveira, formado na Universidad Adventista del Plata, em Libertador San Martín, na Argentina, elogiou a formação dos colegas que conheceu durante o curso. “Os CRMs (Conselhos Regionais de Medicina) deveriam buscar conhecer o nível de formação dos médicos daqui. Eles se darão conta que são ótimas formações. Esse pré-julgamento é hostil e bobo.”
“Ato de resposta”
Na entrada da Base Aérea de Belém (PA), cerca de 50 manifestantes aguardavam a chegada dos médicos formados no exterior que irão trabalhar no Pará. Debaixo de forte sol e aguentando os quase 40ºC de temperatura da tarde deste sábado na capital paraense, entoavam gritos de apoio, como “Cubano é meu amigo / Mexeu com ele, mexeu comigo” e erguiam cartazes com os dizeres “Pará de braços abertos” e “Hay que cuidar de la salud sin perder la ternura”.
A maioria dos manifestantes era ligada a partidos políticos como o PT e o PC do B. Entidades estudantis como a UNE (União Nacional dos Estudantes) e a Ubes (União Brasileira de Estudantes Secundaristas) também estavam presentes no ato, que foi organizado via internet.
“É um ato de resposta ao que aconteceu em Fortaleza”, disse Jorge Lucas Neves, estudante de ciências sociais da UFPA (Universidade Federal do Pará) e presidente regional da UNE. “Tem muitos lugares no Pará sem médicos. Estamos solidários ao programa.”
Alguns manifestantes conseguiram negociar com os militares a entrada na Base Aérea de Belém. Ao sair do avião, os médicos eram aplaudidos, recebiam flores, e chocolates. Em outros momentos, os gritos faziam alusão a um dos mais famosos episódios da repressão da ditadura civil-militar brasileira (1964-1985), ocorrido no Pará: a guerrilha do Araguaia. “Tarda mas não falha / Aqui está presente a juventude do Araguaia”, cantavam.
Fonte: Blog Viomundo

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