A ativista Sabrina Bittencourt, de 38 anos, que ajudou a denunciar crimes sexuais de líderes religiosos, como João de Deus e Prem Baba, cometeu autoextermínio no sábado (2), em Barcelona, Espanha, onde morava.
Em publicação realizada na noite de ontem, Sabrina escreve que fez o que pôde até onde pôde para lutar: “Perdão por não aguentar”.
Em publicação realizada na noite de ontem, Sabrina escreve que fez o que pôde até onde pôde para lutar: “Perdão por não aguentar”.
O filho da ativista, Gabriel Baum, publicou sobre a morte da mãe e enalteceu os ensinamentos dela. “Ela só se transformou em outa matéria. Nós seguiremos por ela. Foi isso que minha mãe me ensinou e ninguém vai poder tirar de mim. Não permitam que manchem o nome dela”, disse, em trecho publicado.
“Minha mãe passou o ano todo me preparando, mas nunca estamos preparados mesmo”, disse. “Minha mãe lutou até o final, ela não desistiu. Ela só se libertou do inferno que estava vivendo. Eu preciso ser forte pelos meus irmãos. Eu sou filho de Sabrina Bittencourt e somos imparáveis”, conclui Gabriel.
A presidente da ONG Vítimas Unidas, Maria do Carmo Santos, publicou uma nota de falecimento – Sabrina trabalhava com a organização. “A luta de Sabrina jamais será esquecida e continuaremos, com a mesma garra, defendendo as minorias, principalmente as mulheres que são vítimas diárias do machismo”, escreveu.
Carta de despedida e luto
Na publicação de despedida, Sabrina cita Marielle Franco, vereadora assassinada em março do ano passado – o crime não foi elucidado até hoje. “Marielle me uno a ti. Somos semente. Que muitas flores nasçam dessa merda toda que o patriarcado criou há 5 mil anos!”.
“Volto pro vazio e deixo minha essência em PAZ. Aos meus amigos, amadas e amantes, nos encontraremos um dia! Sintam meu amor incondicional através do tempo e do espaço. SIM e FIM”, conclui a ativista, doutora Honoris Causa pelo trabalho realizado no México, na UCEM (Universidad del Centro).
Sabrina foi abusada sexualmente desde os 4 anos por religiosos da igreja frequentada pela família, mórmon. A ativista chegou a ficar grávida aos 16 anos por um dos estupradores, e abortou. Durante a vida, ela lutou contra abusos por líderes religiosos e participou da criação do Coame (Combate ao Abuso no Meio Espiritual).
Ela sofria ameaças de morte frequentemente e vivia fora do Brasil, tendo, inclusive, de se mudar com frequência. “Sou sobrevivente, resiliente, passei por outros problemas de saúde derivados de todos os traumas (amnésia e agora estou tratando um câncer no sistema linfático). A superação é algo diário”, escreveu em texto publicado por ela na Marie Claire (leia na íntegra aqui).
O perfil dela recebeu dezenas de homenagens e publicações de luto.
Publicação feita por Sabrina na noite de sábado:
“Marielle me uno a ti. Somos semente. Que muitas flores nasçam dessa merda toda que o patriarcado criou há 5 mil anos! Eu fiz o que pude, até onde pude. Meu amor será eterno por todos vocês. Perdão por não aguentar, meus filhos. VOCÊS TERÃO MILHARES DE MÃES NO MUNDO INTEIRO. Minhas irmãs e irmãos na dor e no amor, cuidem deles por mim… ❤️ Eu sempre disse que era só uma pequena fagulha. Nada mais. Só pó de estrelas como todos. USEM A SUA PRÓPRIA VOZ. A SUA PRÓPRIA VONTADE. TOMEM AS RÉDEAS DE SUAS PRÓPRIAS VIDAS E ABRAM A BOCA, NÃO TENHAM VERGONHA! ELES É QUEM PRECISAM TER VERGONHA. Não aguento mais. Todas as provas, evidências, sistemas de apoio, redes organizadas e sobretudo, meu legado e passagem por aqui está entregue ou chegará às mãos corretas. As REDES DE APOIO AOS BRASILEIR@S FORAM CRIAD@S E SE EXPANDIRÃO NA VELOCIDADE DA LUZ! Não se desesperem. Dessa vida só levamos o mais bonito e o aprendido. Paulo Pavesi, eu sinceramente sinto muito pela morte do seu filho. Tenha certeza, que se eu soubesse da sua história na época, implicaria minha vida e segurança como fiz com centenas de pessoas. Damares, eu sei que você não teve tratamento psicológico quando deveria e teve sequelas, servindo de marionete neste sistema de merda que te cooptou, acolheu e com o qual você se sente em dívida o resto da sua vida. Não tenho dúvidas que você amou e cuidou da sua “Lulu” como gostaria de ter sido cuidada e protegida na sua infância, mas ela nao é uma bonequinha bonita que você poderia roubar e sair correndo… Giulio Sa Ferrari, eu te considerei um irmão e você sabia de todas as minhas rotas de fuga… eu vi em você a pureza de um menino que nunca foi notado por uma sociedade neurotípica que não entendia os neuroatípicos, mas reputação é algo que se constrói e não é de um dia ao outro. Gabriela Manssur, muito obrigada por me fazer ter esperança de que elas serão ouvidas e atendidas em suas necessidades. João de Deus, Prem Baba, Gê Marques, Ananda Joy, Edir Macedo, Marcos Feliciano, DeRose Pai, DeRose filho, todos os padres, pastores, bispos, budistas, espíritas, hindús, umbandistas, mórmons, batistas, metodistas, judeus, mulçumanos, sufis, taoístas, meus familiares, Marcelo Gayger, Jorge Berenguer, eu desconheço a sua infância e a sua criação pelo mundo, mas sei no meu íntimo que TODO MENINO NASCEU PURO e foi abusado, corrompido, machucado, moldado, castrado, calado, forçado a fazer coisas que não queria, até se converter talvez, cada um à sua maneira, em tiranos manipuladores (em maior ou menor grau) que ao não controlar os próprios impulsos, tentam controlar a quem consideram mais frágil e assim praticam estupros, pedofilia, adicções diversas… Eu sei, eu sinto, eu vi. Mas ainda assim, preferi SEMPRE ficar do lado mais frágil nesta breve existência: mulheres, crianças, idosos, jovens, povos originários, afrodescendentes, refugiados, ciganos, imigrantes, migrantes, pessoas com deficiência, gays, pobres, lascados, fudidos, rebeldes e incompreendidos… Essa vida é uma ilusão e um jogo de arquétipos do bem e do mal, de dualidades… desde que o mundo é mundo. Vivo num outro tempo desde que nasci e sempre senti que vivia num mundo praticamente medieval. Volto pro vazio e deixo minha essência em PAZ. Aos meus amigos, amadas e amantes, nos encontraremos um dia! Sintam meu amor incondicional através do tempo e do espaço. SIM e FIM.”
Fonte: BHAZ
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